Acabo de ler notícia da BBC dando conta que o presidente Vladimir Putin pediu permissão ao Parlamento para usar tropas na crise ucraniana, de modo a preservar vidas de cidadãos russos. [http://www.bbc.com/news/world-europe-26400035] Eu tinha certeza de que a Rússia interviria no vizinho de alguma maneira, a fim de desestabilizar qualquer governo pró-OTAN que lá se estabelecesse. Mas não estava tão certo se ocorreria uma interferência direta. Para isso seria necessária ainda mais coragem do que aquela demonstrada no causo da Geórgia, mais especificamente Ossétia e Abkhazia. Bom, coragem não parece faltar ao presidente russo, pra alguma coisa lhe serve ter origem na KGB. A justificativa que está sendo usada pela Rússia, por sua vez, era bastante óbvia. Mais de vinte milhões de russos vivem nos países do antigo entorno soviético, e na Crimeia, uma das regiões mais ricas da Ucrânia, são inclusive maioria. As explicações oficiais para a intervenção na Geórgia também partiram daí.
Mas o que está ocorrendo na Ucrânia?
A Ucrânia é hoje, em vários sentidos, o centro do mundo. A situação é bastante complexa por um lado e de uma simplicidade meridiana por outro. Temos um presidente eleito cujo governo de merda e corrupto criou uma tremenda insatisfação popular. A população está nas ruas exigindo, em parte, mudanças no governo, e em parte, uma mudança do próprio governo. Esta população se divide em filo-liberais, forças ocidentalizantes, partidários da União Europeia, russófobos, russos étnicos e filo-russos, partidários da herança eslava, uniatas, ortodoxos que pretendem uma separação do Patriarcado de Moscou, ortodoxos fiéis à Igreja, anti-ocidentais, socialistas, nacionalistas de todos os tipos incluindo movimentos de terceira posição que sonham com algum tipo de isolacionismo e autonomia ucraniano. Mas, de fato, todo este caos, com ou sem a intenção de seus diversos agentes, não passa do cenário para uma disputa geopolítica pelo destino da Ucrânia e pelo controle da Eurásia. Os Estados Unidos e seu braço armado, a OTAN, pretendem, com ou sem a União Europeia, manter e aprofundar sua hegemonia, expandindo-se para o leste, criando mais um Estado títere em uma região vital em termos políticos, se possível expulsando de vez a presença militar russa da Crimeia e dando um xeque mate no país em termos geoestratégicos. A Rússia, que nasceu de fato em Kiev, visa sobreviver ao cerco, sendo vital para isso sustentar sua presença política, militar e demográfica em seu entorno histórico direto, ou seja, pelo menos no leste industrializado da Ucrânia, região que possui armas nucleares, milhões de russos étnicos e um frota de navios estacionada próxima a Sebastopol. Não há ''futuro autônomo'' para a Ucrânia sem que se leve em conta estes dois pólos, e quem pensa que há está apenas se iludindo. Ou o país cai no colo do Oeste, tornando-se títere de tropas que apontarão mísseis para a Rússia a partir de uma posição estratégica em pleno coração eurasiático, ou o país manterá os laços históricos que o unem à civilização russa, sendo a vanguarda de resistência à expansão da OTAN. A terceira opção é a divisão do país entre os dois lados após uma sangrenta guerra civil com intervenção maciça, ainda que nem sempre direta, de países estrangeiros. Ou seja, balcanização da região.
A Ucrânia é, histórica e culturalmente, uma Rússia. Foi lá que nasceu, no século X, o primeiro Estado russo, a Rus' de Kiev, que se expandiu para Oeste e leste organizando em torno de si as etnias da região, fossem ou não eslavas. A partir do século XII, Kiev sofreu concorrência de outros principados russos, e, depois, todos eles foram invadidos e dominados pela Horda Dourada. Depois que esta foi expulsa, a Ucrânia sofreu conquista ocidental, germânico-polonesa, da qual se viu livre pelas vitórias russas. Raramente o país foi autônomo ou possuiu fronteiras definidas. Sua religião, seu alfabeto, seus costumes, seu folclore, sua visão de mundo são tão russos quanto os dos demais russos. Falar, portanto, de ''opressão russa'' nesse causo é totalmente dissonante com a realidade. Milhões de russos que vivem na Ucrânia, e milhões de ucranianos, ainda que não russos, desejam manter vínculos com sua herança histórica e a aliança estreita com a civilização russa. A novidade aí está na existência daqueles que pretendam uma ruptura e transformação profunda nessa herança e vínculos, redefinindo a identidade ucraniana através de uma ''russofobia'' totalmente ridícula. Os soviéticos sacanearam a Ucrânia? Também não foram bonzinhos para os russos, e Stalin era georgiano. O que os soviéticos tinham, na verdade, era justamente aquilo que os russófobos querem perpetuar, uma busca por romper com a raiz do próprio país e se ajustarem a esquemas de pensamento e vida nascidos e exportados pela Europa.
Em tempo: antes que me acusem, não sou contra uma Ucrânia independente. Só tenho a plena consciência de que isso é incompatível com a ocidentalização do país e sua submissão à OTAN.
Para ser mais exato, na Ucrânia há uma região que se identifica muito mais com o Ocidente que com a Rússia, que é a Galícia. E é dessa região que vem o grosso dos neonazis ucranianos e que na Segunda Guerra Mundial forneceu grande efetivo de colaboradores para os nazistas, a ponto de ter tido uma unidade especial de granadeiros da Waffen SS da região, a 14th Waffen SS Galitzien. O que os nazi-banderistas querem é mover a linha divisória oeste x leste dos Cárpatos para o Rio Don.
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