segunda-feira, 27 de maio de 2019

A paralisia do governo Bozó, ou: um Reino dividido não pode subsistir

A imagem pode conter: 2 pessoas, pessoas andando, criança e atividades ao ar livre
Apoiador de Jair Bozó em traje que expressa os compromissos mais profundos do Presidente -- roupa de Capitão América e bandeira de Israel: guerra santa contra o totalitarismo e na defesa do ''Ocidente judaico

O Reino dos Bozós se encontra paralisado, incapaz de atender as expectativas dos grupos que apostaram suas fichas nele nas eleições do ano passado. Que não se tire daí a conclusão de que as forças nefastas que se associaram a Jair Bolsonaro estão próximas da derrota definitiva por causa dos problemas atuais do governo.

Repito: o Reino dos Bozós foi o arranjo possível que campos políticos, econômicos e sociais comprometidos com a ocidentalização do nosso país e a agenda neoliberal encontraram para chegar ao Executivo Federal. Essas forças convivem em um desenho de governo muito instável, que tem  bases que se friccionam.

Dentro desse saco de gatos há uma disputa intensa por protagonismo por parte de grupos que querem determinar a cara do atual governo. Bozó não tem capacidade ou sagacidade para alinhavar ou manobrar em meio a esse rol de interesses, e nesses cinco meses foi fazendo escolhas atabalhoadas, queimando pontes, atirando pela janela capital político e aliados que ainda lhe seriam úteis. Quando viu, ficou isolado em uma balhata da qual jamais poderia sair vencedor.

O grupo que Jair decidiu ser o seu no interior da maçaroca que o apóia foi o de seus filhos, e portanto o de Olavo de Carvalho. Eis a real agenda com a qual o presidente eleito se mostrou comprometido, a de servir de agente da CIA, posar de instrumento do ''Ocidente Judaico-cristão'' na sagrada cruzada contra o marxismo cultural, o de manter vínculos com Bannon, com o sionismo e com a ''revolução conservadora'' que, segundo o guru da Virgínia, estaria acontecendo no país e tornaria possível ao ''escolhido por Deus'' reformar de vez o Estado aparelhado por temíveis comunas. Nesse lugar repousa o disputado coração, o cômodo mais íntimo e determinante das políticas do Reino.

É esse papel messiânico, de soldado olavete, que Bozó esteve disposto a cumprir até aqui. Os demais círculos de influência foram sendo colocados para escanteio, ou deixados à margem para serem usados como trunfos demagógicos capazes de manter o fôlego de sua popularidade [como os acenos pra bancada da bala por meio do ''decreto desarmamentista''].

Bebbiano e o PSL descobriram cedo que não teriam a parte saborosa do bolo; Mourão foi considerado inimigo da Dinastia dos Bozós; as Forças Armadas foram denegridas; Sérgio Moro descobriu que está sendo mais usado do que usando o governo; e a agenda liberal está em banho maria porque o Presidente se recusa a governar.

Grande parte das críticas que são feitas a Jair Bozó vem daqueles que gostariam que ele desse prioridade a outros membros que formam a figura distorcida do Reino, em vez de se atirar de vez a essa pauta olavética ou ianque-sionista, de guerra santa contra o comunismo que estaria ameaçando o Ocidente e o Brasil. A grande mídia, por exemplo, critica Bozó por sua recusa do papel de pragmático tocador da agenda neoliberal de Paulo Guedes.

O próprio Centrão está disposto a embarcar no lero-lero de Rodrigo Maia e aprovar na Câmara parte da agenda liberal que Bozó não consegue levar adiante porque está pensando em outras lutas que lhe parecem ser mais prioritárias, segundo o mapa de guerra estabelecido pelo ideólogo da Virgínia.

Que ninguém imagine que o Centrão ou a grande mídia estão em pé de guerra contra Bozó por ser ele neoliberal. E sim porque ele preferiu o olavetismo às Reformas que o tal do mercado acreditou que ele quisesse implementar. [no caso do Centrão, evidentemente, há o desejo de que o Presidente faça a política partidária, parando de se preocupar com o ato santo de derribar as ''instituições corruptas'']. 

Esses atores ainda sonham com um surto de sanidade em Jair Bozó. Que ele se desnude do uniforme de templário e se torne uma versão mais radicalizada da ''República paulistocêntrica'', levando a efeito a destruição da Era Vargas iniciada por Fernando Henrique Cardoso. Afinal, o que eles queriam mesmo era um Alckmin que falasse grosso.

Penso que esses grupos estão sonhando acordados, viajando na maionese. A barca do Bozó é a barca egípcia olavética, de gente doida e desmiolada, que se pudesse levaria o Brasil a uma guerra contra a Venezuela pra atender à CIA, e que acredita que a aliança entre o Presidente e as massas conservadoras são a chave para uma ''revolução liberal''.

O delírio que se encontra no coração do Reino, ou seja, a adesão do Presidente ao ianque-sionismo escalafobético intrínseco à visão de mundo de Olavo de Carvalho, gera um impasse que está longe de ser resolvido e que tem de ser explorado. A paralisia do Reino não é excruciante para nós, que somos patriotas, até porque não existe num horizonte próximo uma alternativa que nos permita virar o jogo de forma imediata.

Além disso, mirar em Bozó é importante. Afinal, ele foi o nome que permitiu ao arranjo disforme conquistar o Palácio do Planalto. Ferir sua popularidade, destruir seu capital político, reduz o espaço de manobra das forças nefastas que citei, pelo menos a curto prazo, e abre possibilidades de contestação à atual posição central que elas ocupam no campo político.

Em breve, pretendo esboçar uma análise mais detalhada dos primeiros meses do mandato de Bozó. Por enquanto, sugiro os primeiros parágrafos desse pequeno texto que escrevi em novembro do ano passado: O Reino dos Bozós: o que esperar do governo Bolsonaro? Parte II .


quarta-feira, 15 de maio de 2019

Grandes Temporadas da Era Aberta XVIII: Serena Williams, em 2015



O mais fascinante na carreira de Serena Williams é sua capacidade de se reinventar ao longo dos anos e atingir o pico de sua performance em uma fase em que a maioria das jogadoras enfrenta o declínio técnico e físico. Não se trata apenas de apontar que Serena se mantém em alto nível depois dos trinta anos, algo que outros gênios também fizeram. Mais do que isso, foi depois dessa idade que Serena impôs seu domínio mais duradouro e marcante no circuito feminino.

Não pretendo causar mal entendidos. Antes de 2012, a carreira da mais jovem das irmãs Williams já seria suficiente para estabelecê-la como uma das maiores tenistas de todos os tempos. Até então, ela havia conquistado 39 títulos, incluindo 13 Grand Slams, e se consolidado como a sétima jogadora com o maior número de semanas como número um do mundo [123 semanas]. Mas Serena se recusou a aceitar o já enorme tamanho que possuía no esporte, e mostrou para todos que era, literalmente, imparável.


Depois que completou 30 anos, a norte-americana venceu mais 33 títulos, incluindo 10 majors, e acrescentou 196 semanas ao seu total como líder da WTA, chegando a igualar o recorde de 186 semanas consecutivas no topo que pertencia a Steffi Graf. Se antes de 2012 Serena havia terminado duas temporadas à frente do circuito, depois dessa data ela realizaria a façanha mais três vezes. E todos esses números são provisórios, já que ela promete retornar para superar o número de 24 majors de Margaret Court. Poucos duvidam.

Diante disso, é defensável que 2015 não tenha sido o ano de seu melhor desempenho em quadra. Em 2013, por exemplo, ela levantou 11 taças e obteve um aproveitamento superior a 95%. Mas nunca antes na carreira de Serena ela esteve tão perto do Calendar Slam. Mais especificamente, faltavam dois jogos para que o sonho dos torcedores norte-americanos se realizasse em plena Nova York. 


A derrota para Roberta Vinci na semifinal do torneio não tira o brilho da supremacia de Serena nos majors. Entre o USO 2014 e o Aussie Open 2017 foram onze semifinais, oito finais e seis títulos. Nesse período, Williams monopolizou o número um do ranking entre fevereiro de 2013 e setembro de 2016, liderando o circuito de ponta a ponta em 2014 e 2015.

Dona de saque e devolução mortais e de um dos mais poderosos forehands já vistos, Serena conquistou também 16 majors e 3 medalhas olímpicas em duplas femininas e mistas. Em 2015, foi campeã do Australian Open, de Roland Garros e de Wimbledon. Derrotou tenistas como Venus Williams, Maria Sharapova, Vika Azarenka, Simona Halep, Garbine Muguruza, dentre outras. Chegou também a 94,43% de aproveitamento, com 53 vitórias e apenas 3 derrotas ao longo do ano. Onde ela vai parar, nem o tempo mais ousa dizer.

segunda-feira, 13 de maio de 2019

Série Grandes Temporadas da Era Aberta XVII: Justine Henin, em 2007



Em entrevista em 2007, Martina Navratilova se mostrou feliz pelo circuito possuir um ''Federer feminino'' para logo depois, sorrindo, acrescentar: ''Ou talvez seja a ATP que tem a Henin masculina''. Essa era exatamente a impressão que o tênis de Justine deixava no público e nos adversários, tamanha a sua beleza e completude.

A belga sempre foi fã declarada de Steffi Graf, que tomou por modelo desde os inícios dos anos 1990. Henin tem de fato propriedade para reivindicar essa herança. Assim como Hingis, era jogadora de incrível habilidade, movimentação, capacidade de improviso e variação. Em uma era de jogadoras de fundo agressivas, ela passeava por toda a extensão da quadra, com desenvoltura tanto no jogo de base quanto na rede, onde era capaz de voleios impressionantes. Se seu forehand era uma das maiores armas do circuito, seu revés simples era tido como o melhor e mais belo do mundo.


Justine terminou o ano como número um do mundo três vezes, em 2003, 2006 e 2007. Foi campeã de sete majors, e liderou o ranking por 117 semanas [a sétima na lista das que mais ficaram no topo da WTA]. Ainda que tenha chegado à final de todos os majors em 2006, foi em 2007 que seu jogo atingiu definitivamente o auge.

O ano não começou tão bem, já que belga se afastou da disputa do Australian Open por causa do fim de seu casamento. Mas no decorrer da temporada, a número um do mundo chegou a 11 finais e levantou 10 taças, incluindo a do Tour Finals. Venceu também dois Grand Slams: Roland Garros e US Open. Justine atingiu 63 vitórias em 67 jogos, com um aproveitamento de 94%, o maior desde a temporada de Graf em 1995. No US Open daquele ano, Henin se tornou a segunda jogadora a derrotar em um mesmo torneio as duas irmãs Williams. Mas diferente de Hingis -- que havia realizado a façanha no Aussie Open em 2001 mas acabou derrotada por Capriatti na decisão --, conquistou o título passando na final por Kuznetsova.


Justine se retirou cedo do circuito, em meados de 2008, quando contava apenas 26 anos de idade. Retornou em 2010 -- segundo ela, inspirada pela vitória de Federer no Aberto da França 2009 --, mas contusões no cotovelo levaram-na a anunciar a aposentadoria definitiva no início do ano seguinte. Em 2007, Henin derrotou Serena Williams, Venus Williams, Ana Ivanovic, Maria Sharapova, Amélie Mauresmo, Jelena Jankóvic, dentre outras grandes tenistas.

sexta-feira, 10 de maio de 2019

Série Grandes Temporadas da Era Aberta XVI: Martina Hingis, em 2007


Embora a precocidade não fosse incomum entre os gênios do tênis até uma geração atrás, Martina Hingis deixou todos de queixo caído quando em 1996, contando apenas 15 anos de idade, venceu o torneio de duplas femininas em Wimbledon. Não contente com isso, realizou no ano seguinte uma das maiores temporadas de uma tenista na Era Aberta.

É como se o circuito feminino tivesse se tornado o playground de uma menina, ou a festa de uma adolescente. Em 1997, Martina se tornou a mais jovem tenista a vencer um Grand Slam em simples com a conquista do Australian Open. Ela possuía apenas 16 anos e 3 meses, mais nova do que Seles quando de sua conquista de Roland Garros sete anos antes. Detalhe: ela levantou a taça sem perder um set sequer em sua campanha -- façanha que ela repetiria no US Open. Foi também com uma vitória sobre Seles em Miami que ela se tornou a mais jovem número um que o mundo já havia visto. Martina também é a mais jovem campeã em simples da história de Wimbledon e do US Open.

O jogo de Hingis não possuía a potência que se tornava padrão em seu tempo, mas era intuitivo, tático e talhado por sua dedicação às duplas, modalidade em que conquistou 13 majors na chave feminina e 7 nas mistas. Não é à toa que ela é, ao lado de Navratilova e Pam Shriver, a única tenista a conquistar o Calendar Slam em duplas femininas, feito alcançado em 1998.


Em 1997, Martina deu início a uma sequência de 80 semanas ininterruptas no topo do ranking da WTA e às seis finais consecutivas que fez no Aussie Open. Entre o US Open de 1996 e Roland Garros 1999, a suíça chegou a 11 semifinais seguidas, jogou oito finais e conquistou cinco Grand Slams. Alcançou todas as finais de majors no ano, e levantou a taça em Melbourne, no All England Club e em Nova York, vencendo respectivamente Mary Pierce, Jana Novotna e Venus Williams nas finais. Foram 12 títulos em 13 finais, e 75 vitórias em 80 jogos [um aproveitamento de 93,75%].

A carreira de Hingis foi comprometida por lesões que a obrigaram a passar por cirurgias em ambos os tornozelos e a se retirar no início de 2003, quando contava apenas 22 anos de idade. Naquele momento, ela era a quarta tenista com o maior número de semanas como número 1 do ranking da WTA [209 semanas, atrás apenas de Graf, Navratilova e Evert; mais tarde ela foi ultrapassada também por Serena Williams]. 

A suíça retornou ao circuito quatro anos depois, alcançando mais uma vez o top 10. Mas anunciou de novo a aposentadoria no fim de 2007 depois que um metabólito de cocaína foi encontrado em um teste antidoping -- Martina nega até hoje o uso da droga.



terça-feira, 7 de maio de 2019

Série Grandes Temporadas da Era Aberta XV: Monica Seles, em 1992




Monica Seles já havia surpreendido os amantes do tênis ao se tornar a mais jovem campeã de majors da Era Aberta quando venceu Roland Garros em 1990 tendo apenas 16 anos e 6 meses de idade. Ela batia assim o recorde que pertencia a Tracy Austin no US Open [16 anos e 8 meses] -- para conhecer uma campeã ainda mais jovem, o mundo teria de esperar a chegada de Martina Hingis.

Mas era só o primeiro sinal do que viria nos dois anos seguintes. Do início de 1991 ao de 1993, Seles decidiu 33 dos 34 torneios que disputou e venceu 55 de seus 56 jogos em Grand Slams. Entre Melbourne 1991 e 1993, a jovem tenista entrou em quadra para competir em 8 majors e conquistou sete deles.

O estilo de Seles era único e muitos não o consideravam vistoso ou inteiramente replicável. Era muito criticada por seus grunhidos altos quando batia na bola, sendo alvo de reprimenda de Martina Navratilova na semifinal de Wimbledon em 1992. 


Nada disso era capaz de deter o furacão de petardos que a canhota disparava da base para cima das adversárias: A sérvia possuía grande velocidade no fundo de quadra, com uma espetacular movimentação lateral. Jogava com as duas mãos tanto na direita quanto na esquerda, mantendo os braços próximos ao corpo, com golpes incrivelmente potentes, e, como se tornou marca das escolas do leste europeu, mudando rapidamente a direção da bola em meio a ataques sucessivos. Com o toque dos gênios, antecipava em quinze ou vinte anos o estilo que se tornaria modelo no circuito.

1991 foi uma temporada espetacular para Monica, com a conquista de todos os majors em que competiu -- ela pulou Wimbledon por causa de uma contusão --, um total de 10 títulos [incluindo o Tour Finals] e o aproveitamento de 92,5%, com 74 vitórias em 80 jogos. 

Mas 1992 foi ainda melhor, e constituiu o cume do tênis de Seles. Ela chegou à final de todos os Grand Slams [vencendo o Australian Open, Roland Garros e US Open], faturou também 10 torneios [incluindo o Tour Finals] e alcançou aproveitamento de 93,33%, com 70 vitórias em 75 jogos. Além disso, foi líder do ranking do início ao fim do ano, impondo sua hegemonia de modo inconteste.


Esse impressionante domínio foi interrompido por uma ação vinda de fora de quadra, pelas mãos de um maníaco em abril de 1993 durante um jogo pelo torneio de Hamburgo. A número um do mundo foi esfaqueada pelas costas em episódio traumático que colocou fim a um dos períodos mais gloriosos já vistos no circuito feminino. 

Mais do que as chagas físicas, o ataque deixou em Seles um conjunto complexo de feridas emocionais, que, ao lado de outros problemas pessoais, a levaram à depressão, à compulsão por comida e à dúvida sobre se queria ou não continuar jogando.

A sérvia retornou ao circuito em 1995, voltou a ser número 1, permaneceu como uma das mais importantes jogadoras da WTA durante todos os anos 1990, chegou à final de outros três majors e conquistou o Australian Open em 1996. Embora seu domínio não tenha se repetido, os anos posteriores confirmaram que ela fazia parte do Olimpo do tênis.

Em 1992, Seles conquistou títulos em cima de Steffi Graf, Martina Navratilova, Arantxa Sanchez, Conchita Martínez, Mary Joe Fernández, Gabriela Sabatini dentre outras.


domingo, 5 de maio de 2019

Série Grandes Temporadas da Era Aberta XIV: Steffi Graf, em 1988


Fraulein Forehand

Já são trinta anos desde a mágica temporada de Graf em 1988. A espantosa performance da alemã não pode ser traduzida em frases simples. Ela já havia chegado à final de 3 majors no ano anterior, vencido Roland Garros e desbancado Navratilova do posto de número um do mundo, dando início às 186 semanas consecutivas na liderança do circuito [que Serena Williams igualou em 2016] e ao recorde de 377 semanas totais como primeira do ranking. Mas quando 1988 começou, Graf era ainda uma mortal. No fim de setembro, havia se convertido em uma deusa capaz de milagres.

1988 se tornou a segunda das oito temporadas em que Graf terminaria como número um da WTA, e a primeira das cinco em que liderou o ranking de ponta a ponta. Fica no meio de uma sequência de treze finais consecutivas de majors entre os Abertos da França de 1987 e 1990 [para efeitos de comparação, Federer é o recordista entre os homens, com dez seguidas]. 

Mas nem todos concordam que tenha sido o ano em que ‘’Fraulein Forehand’’ jogou o seu melhor. De fato, em 1989 ela venceu um número maior de títulos -- 14, incluindo 3 majors e o Tour Finals, o equivalente a Master Cup da ATP--, e alcançou o aproveitamento de 97,73%, com 86 vitórias e apenas 2 derrotas. Campanha muito similar à de Navratilova em 1983, com apenas uma derrota a mais. 


No entanto, essa ‘’derrota a mais’’ é justamente a razão porque 1989 exerce fascínio menor do que 1988. Ela se deu na final de Roland Garros para Arantxa Sanchez depois que Steffi sacou para o jogo em 5-3 no terceiro set, acabando com a possibilidade do Calendar Slam.


O Golden Slam

O “annus mirabilis” teve início com a conquista do primeiro Australian Open disputado em hard court, sem perder nenhum set e passando por Chris Evert na final. Graf tampouco deixou sets em Roland Garros, e na partida decisiva aplicou uma bicicleta em Natasha Zvereva em rápidos 32 minutos de partida, a maior demolição já realizada contra uma rival na final de um torneio dessa magnitude.

O passo seguinte foi completado em julho: Embora já contasse com 31 anos de idade, Navratilova permanecia Rainha inconteste de Wimbledon, com oito títulos em oito finais, e já havia superado Graf em dois majors. Na final, Martina levou o primeiro set – o primeiro que Graf perdeu em GS naquele ano -- e abriu uma quebra de vantagem no segundo, mas foi derrotada nas últimas duas parciais por 6-2 e 6-1. 


Na entrevista que se seguiu, a tcheca declarou que ‘’um capítulo havia se fechado’’ e que se sentia ‘’passando uma tocha adiante’’. Depois disso, o Calendar Slam veio quase que naturalmente em Nova York, em cima da argentina Gabriele Sabatini, amiga e parceira de duplas de Graf -- uma amostra que a nova geração chegava de fato para substituir a anterior.

O quadro pintado pela alemã não ficaria tão especial sem as Olimpíadas, realizadas logo depois do US Open. Ela já havia vencido o torneio teste em Los Angeles 1984, disputado só com tenistas abaixo de 21 anos, e viajou para a Coréia com o objetivo de se tornar a primeira campeã olímpica de tennis em mais de sessenta anos. Quando Steffi conquistou a medalha de ouro, mais uma vez derrotando Sabatini na final, o mundo percebeu que estava diante de um fato talvez único, nunca antes imaginado. Os jornalistas criaram rapidamente um epíteto para a façanha: “Golden Grand Slam”.

E em um raciocínio circular, típico de quando se tenta explicar de forma racional o sentimento provocado por uma grande obra de arte, é possível dizer que 1988 deslumbra os fãs do esporte porque é o ano do “Golden Slam”, e “Golden Slam’’ é o nome que o mundo teve de criar pra se referir àquilo que Graf realizou em 1988.


A Tenista Completa

Steffi criou um novo parâmetro a partir do qual todas as demais performances seriam avaliadas. Sua movimentação e ‘’footwork’’ superaram a dicotomia entre a linha de base e o jogo de rede que havia imperado durante a rivalidade entre Evert e Navratilova, sintetizando-os, segundo a própria Chrissie, em um estilo apropriado para todas as quadras. 


A magnífica campanha de 1988 foi coroada com 11 títulos e 72 vitórias em 75 jogos, um aproveitamento de 96% [o terceiro maior da carreira de Graf e o sétimo maior da história], e a conquista de Grand Slams em três diferentes superfícies [hard, saibro e grama] – façanha que Navratilova havia realizado em 1984, que Rafael Nadal realizaria em 2010, e que Graf repetiria em três outras temporadas

quinta-feira, 2 de maio de 2019

Série Grandes Temporadas da Era Aberta XIII: Navratilova, em 1983



Os tempos atuais nos tornaram céticos quanto às alegações de grandeza baseadas apenas na plástica do jogo ou na habilidade de um atleta, e talvez esse não seja o caminho mais efetivo para apontar o tamanho real de Martina Navratilova no esporte e explicar porque ela é considerada por muitos como a maior tenista já surgida. Todos pedem números. O que levanta a questão de saber que números seriam suficientes.

Para alguns é suficiente lembrar que, tendo vencido 18 majors em simples, ela ainda encontrou tempo para conquistar outros 31 em duplas femininas e mais 10 em duplas mistas. Ou que foi recordista de semanas como número um do ranking [antes que Graf batesse suas 332 semanas na ponta] e continua recordista de semanas como número um em duplas [223 semanas]. E que terminou sete temporadas na primeira posição da WTA, sendo três vezes líder de ponta a ponta no ano.

Talvez seja necessário acrescentar que Martina venceu 167 títulos de simples [recorde na Era aberta, já que 100 dos 192 torneios de Margaret Court são anteriores a 1968], e que ainda levantou outros 177 em duplas femininas e 15 em duplas mistas, perfazendo um total de 359 taças como profissional.

Um caminho alternativo seria mencionar os 11 títulos do Tour Finals [o equivalente na WTA da Master Cup/Finals da ATP], as mais de 1400 vitórias em simples na carreira, as 4 Fed Cups


Estamos falando da maior jogadora de grama da história, dona de um saque e voleio perfeito, a maior campeã de Wimbledon em simples [nove títulos], a maior finalista do All England Club, e que, em todas as modalidades [simples, duplas e duplas mistas], venceu vinte vezes na grama sagrada inglesa.

Existem também dados mais específicos e de difícil repetição, como o recorde de 74 vitórias seguidas no circuito em um mesmo ano, construído ao longo de 1984, e o fato de que das dez temporadas com maior percentagem de vitórias na história, nada menos do que quatro pertencem a ela [a lista é completada por 4 temporadas de Graf e 2 de Margaret Court].

Eu diria, porém, que é possível sintetizar todo o impacto dos argumentos acima falando da melhor temporada da carreira dessa canhota tcheca. Em 1983, Navratilova venceu 3 Grand Slams [Australian Open, Wimbledon e US Open], dois deles sem perder set [ela perdeu apenas cinco games em Londres e três em Nova York], levantou 16 títulos [incluindo o Tour Finals] e alcançou a marca de 86 vitórias em 87 jogos, um aproveitamento quase perfeito de 98,85%. Ou seja, Martina perdeu apenas um jogo, uma zebra nas oitavas de final de Roland Garros. E há de se registrar que em toda a temporada ela deixou míseros nove sets em quadra.

Para muitos analistas e amantes do esporte, a temporada de 1983 foi o mais perto que alguém chegou da maestria, sendo um dos mais infalíveis indicadores da verdadeira dimensão da tenista americana. Naquele ano, Navratilova venceu todas as suas seis partidas contra Chris Evert, e também derrotou tenistas do porte de Tracy Austin, Andrea Jaeger e Pam Shriver.

quarta-feira, 1 de maio de 2019

Série Grandes Temporadas da Era Aberta XII: Chris Evert, em 1974



O nome de Chris Evert quase sempre vem acompanhado por uma lista quase ilimitada de recordes, alguns deles aparentemente impossíveis de alcançar. As 34 finais e 18 títulos de Grand Slam em simples são a ponta de um Iceberg feito de pura consistência, que a levou às semifinais de 52 dos 56 majors que disputou e à conquista de impressionantes 157 títulos.

Em 1974, os Estados Unidos se apaixonaram definitivamente por aquela jovem de 19 anos que, ao lado de seu noivo Jimmy Connors, colocava fim a uma longa hegemonia dos australianos sobre o esporte. O florescimento de seu jogo deu início a um Reinado que se estenderia por todo o restante da década. Entre 1975 [ano em que o ranking da WTA foi criado] e 1981, Chrissie terminou cinco vezes a temporada como número um do mundo, chegando a enfileirar 113 semanas seguidas no topo.

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Herdando a coroa de Margaret Court e suplantando Billie Jean King como maior tenista dos Estados Unidos, a “Donzela de gelo’’ colocou 16 torneios no bolso, venceu Roland Garros e Wimbledon em um mesmo ano, chegou à final do Australian Open e à semifinal do US Open. Foram 100 vitórias em 107 jogos, um aproveitamento de 93,4%, e o recorde de 56 vitórias consecutivas em um mesmo ano [só batido por Navratilova em 1984].

1974 fez parte também do mais impressionante domínio já visto de uma tenista sobre uma superfície. Entre 1973 e 1979, Evert conseguiu uma sequência de 125 vitórias sobre o saibro. Sua percentagem de vitórias no piso, no qual conquistou 10 Grand Slams [7 vezes em Paris e 3 vezes no har-thru de Nova York], é de dar inveja em Rafael Nadal: nada menos que 94,03%.

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Os números de Evert seriam ainda mais espantosos caso ela não houvesse pulado o Australian Open entre 1975 e 1980, e Roland Garros entre 1976 e 1978, justamente em seus anos áureos. Em 1974, Chrissie acumulou vitórias sobre Margaret Court, Billie Jean King, Martina Navratilova, Evonne Goolagong, Virgínia Wade, Rosie Casals, dentre outras.