Depois dos goleiros, vamos aos maiores atletas rubro-negros em outra posição do campo. A lista é cronológica. Para as postagens anteriores, clique nos links:
Goleiros:
i. Amado Begnino e Yustrich [David Knipel]
ii. Sinforíano García, Antônio Luís Cantareli e Raul Plassmann
iii. Gilmar Rinaldi, Júlio César e Outros.
ZAGUEIROS
O paulista Píndaro, apelidado de O Gigante de Pedra, pode ser definido por seu pioneirismo. Campeão carioca com a camisa do Fluminense, era um dos nove atletas que, por divergências políticas com o mais alto conselho do clube das Laranjeiras, rompeu com a agremiação e foram acolhidos no Clube de Regatas do Flamengo, que criou um Departamento de Esportes Terrestres para eles. Fez parte, portanto, do PRIMEIRO time de futebol e da primeira dupla de zaga do Flamengo.
Líder da primeira equipe campeã d'O Mais Querido, Píndaro conquistou o bicampeonato de 1914/15. Se aposentou em 1919 pra seguir a carreira de médico sanitarista, mas voltou ao time rubro-negro no ano seguinte e atuou na campanha de mais um bicampeonato, em 1920/21.
Não para por aí. Ele foi o primeiro zagueiro a marcar gol pelo Flamengo. Foram três em suas mais de 80 partidas com o Manto Sagrado.
Símbolo da aurora do futebol pátrio, o Gigante participou da primeira seleção brasileira da história. Era o zagueiro na histórica partida contra o Exeter City, realizada no Estádio das Laranjeiras. Aliás, a zaga da seleção era a dupla do Flamengo [Píndaro e Nery], e o Gigante rubro-negro era o capitão do Brasil.
[O escrete tinha sete jogadores de clubes cariocas e quatro de clubes paulistanos. Eram dois jogadores do Flamengo, dois do Fluminense, dois do Botafogo, um do América; dois do Ypiranga, um do Paulistano e um do São Bento.]
Não contente com isso, Píndaro foi titular também das seleções brasileiras que conquistaram a Copa Roca de 1914 [primeiro título levantado pelo Brasil e em plena Argentina] e o primeiro Campeonato Sul-Americano [atual Copa América], em 1919.
Depois de abandonar os gramados, se aventurou como técnico de futebol. E, adivinhem! Foi o primeiro treinador da seleção brasileira em uma Copa do Mundo, a de 1930. [Na primeira postagem sobre os maiores goleiros do Flamengo, contei a história de como Píndaro deixou de fora Amado Begnino da convocação final para o Mundial no Uruguai.]
O Gigante de Pedra é um dos MITOS SAGRADOS e indiscutíveis d'O Mais Querido do Brasil.
Nas fotos acima, Píndaro no primeiro time da história do Flamengo, ainda com a Papagaio Vintém, depois com a Cobra-Coral, e também fotos de passagens na seleção brasileira, como o primeiro jogo e a equipe campeã sul-americana de 1919.
2) DOMINGOS DA GUIA, ''O DIVINO MESTRE'' (1936/1943)
"Caricaturistas iam para o Estádio Centenário surpreender atitudes de Domingos. Domingos encolhido a um canto, antes do jogo, com uma capa de borracha sobre os ombros. Domingos jogando. Um filme em caricatura. Tudo o que Domingos fazia interessava, era um motivo jornalístico. Os jornais uruguaios se deram até ao trabalho de uma estatística. Para saber a quanto somava só o público de Domingos. Quando Domingos deixava de jogar, cinco mil torcedores ficavam em casa, achando que sem Domingos o jogo não tinha graça. Quando Domingos jogava, lá estavam os cinco mil torcedores a mais. [...] Coisa que o Flamengo aproveitou. Queria ser o clube mais popular, mais querido do Brasil, não podia deixar o preto de fora. Indo em busca do preto, o Flamengo ia ao encontro do gosto do povo. Escolhendo Fausto, Leônidas e Domingos, já escolhidos pelo povo, como ídolos. Fazendo a sua transfusão de popularidade."
Mário Filho, "O Negro no Futebol Brasileiro"
Considerado por muitos como o maior zagueiro brasileiro da História, Domingos vem de uma família nascida e criada no bairro de Bangu, e que forneceu grandes nomes para o nosso futebol. Ladislau, seu irmão, foi o maior artilheiro da história do Bangu, um dos mais tradicionais clubes da antiga capital. Ademir da Guia, seu filho, se tornou o maior ídolo do Palmeiras.
Domingos foi descoberto nas peladas da Zona Oeste do Rio [a antiga Zona Rural, ou ''sertão carioca''], e chegou ao time da fábrica [O Bangu nasce em torno de uma fábrica têxtil construída com capital inglês] aos 17 anos de idade. Antes de rumar para a Gávea, alcançou renome na cidade e no continente com temporadas vitoriosas pelo Nacional de Montevidéu e pelo Boca Juniors. Os uruguaios, que tinham a principal escola de futebol sul-americano, o chamavam de ''Divino Mestre''.
O Mestre revolucionou a forma de jogar. Era técnico, não dava chutões, fazia poucas faltas. Saía tocando a bola e driblando adversários com autoridade no seu campo de defesa. Sua técnica esplendorosa foi imitada pelos colegas, mas raramente com a mesma competência. [quando um zagueiro tentava sair driblando e falhava se dizia que ele cometera uma ''domingada''.]
O Mestre foi um dos artífices também do florescimento internacional da seleção. Junto com Leônidas, também jogador do Flamengo, participou da equipe que conquistou o terceiro lugar na Copa da França, em 1938, o maior resultado do escrete até então.
Nos anos 1930, um projeto dos dirigentes do Flamengo, e capitaneado pelo Presidente José Bastos Padilha, fez de Domingos uma das causas da imensa popularidade do rubro-negro carioca, que contava com os principais jogadores pretos e mulatos do país. O Flamengo ficou conhecido a partir de então como um clube da nação, de elite e ao mesmo tempo popular, e a paixão pelo Mais Querido inundou todo o território do país a partir das transmissões da Rádio Nacional. O jornalista Mário Filho considerava Domingos da Guia um dos protagonistas na integração do negro no nosso futebol, em um período em que a elite intelectual e política brasileira passou, finalmente, a valorizar nossa herança africana e nossa mestiçagem. Falarei mais desse processo quando tratar do caso de Leônidas da Silva, o Diamante Negro.
Domingos atuou n'O Mais Querido por oito anos, no auge da carreira, defendendo o Manto Sagrado em mais de 220 oportunidades. Atuou ao lado de ídolos como Walter Canegal, Yustrich, Leônidas da Silva, Fausto, Zizinho, Valido e outros. Seus principais títulos são os cariocas de 1939, 1942 e 1943.
Há atletas que, por diversos fatores -- identificação com a torcida, desempenho marcante, longevidade, troféus conquistados -- se tornam instituições dos clubes. O paulistano Jadir teve todas essas características. Com quase 500 partidas defendendo o Manto Sagrado [498 para ser mais exato], é o décimo jogador que mais vezes entrou em campo pelo Flamengo.
Tudo começou quando o ''craque dos torneios de várzea'', ex-ponta esquerda que descobriu sua vocação para ''médio'' -- falarei dessa posição em outra ocasião -- soube no fim de 1951 que o Flamengo procurava um substituto para o volante Modesto Bria. Jadir partiu pro Rio pra realizar o sonho de fazer um teste pelo rubro-negro. Raçudo, impressionou nos treinos e garantiu vaga no elenco.
E então se tornou foco de uma revolução tática da qual Fleitas Solich, técnico da seleção paraguaia, foi um dos pioneiros no futebol brasileiro por meio do Flamengo. Nossos times jogavam em uma adaptação de WM, a DIAGONAL, introduzida também em um revolução tática promovida n'O Mais Querido pelo técnico Flávio Costa. As equipes brasileiras eram escaladas nos jornais da época em um tipo de 3-2-2-3.
Mas Solich, contratado pelo rubro-negro em 1953, realizou a transição definitiva para o 4-2-4, em que o volante que se posta mais atrás era recuado para participar da linha de defesa [se transformando em um 'quarto' defensor, ou quarto zagueiro, que no início podia ser tanto pela direita ou pela esquerda]. Jadir se tornou o 'quarto-zagueiro' da Gávea, atuando ao lado de Pavão.
A mudança tática e a qualidade técnica da equipe transformaram O Mais Querido no clube dominante do Rio de Janeiro durante a maior parte dos anos 1950. Uma equipe que recebeu o apelido de Rolo Compressor e a responsável pela consolidação da torcida do Flamengo como ''dona'' do Maracanã.
Jadir foi fundamental no tricampeonato de 1953/54/55 e sua ausência por contusão no campeonato de 1956 é apontada como uma das principais causas da perda do tetra. Chegou à seleção brasileira em 1957 e só foi cortado na convocação final para a Copa de 1958 porque sofreu uma contusão no joelho em partida contra o Corinthians pelo Torneio Rio-SP.
Seu último grande título n'O Mais Querido foi o Torneio Rio-São Paulo de 1961. Deixou a Gávea em 1962, tendo passagens relâmpago por Cruzeiro e Botafogo, e terminou a carreira no Mallorca, da Espanha, em 1963. No Flamengo, jogou com craques do porte de Evaristo de Macedo, Dida, Zagallo, Rubens, Joel, Henrique e Carlinhos, dentre muitos outros.
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