quarta-feira, 15 de dezembro de 2021

UM RANKING DE CONQUISTAS NO FUTEBOL PELO GRANDES CLUBES BRASILEIROS -- Parte I: critérios gerais e o problema dos Estaduais

 




DO RANKING

 

O atual ranking nasceu de uma brincadeira e é um entretenimento de um apaixonado por futebol. Mas o lado lúdico não impede a objetividade dos critérios que adotei e que vou expor rapidamente. Antes, porém, é necessário esclarecer aquilo que a lista abaixo não pretende nem foi planejada para ser.

Em primeiro lugar, ela não é uma hierarquia entre os clubes brasileiros. Não visa demonstrar que um clubes é maior do que o outro. As instituições listadas são multi-esportivas. Clubes como São Paulo, Vasco da Gama e Flamengo se orgulham de sua história no Remo, no Basquete, na Natação, no Atletismo, na Ginástica Olímpica, no Judô, no Futebol de Salão, no Voleibol etc. O futebol é o esporte mais importante, mas ainda assim só um recorte do que essas instituições representam no esporte brasileiro.

Além disso, é impossível reduzir esse mundo particular que é o futebol a um conjunto de taças empilhadas em salas de memória. Cada um dos clubes listados teve esquadrões e ídolos cuja magnitude e relevância histórica e desportiva transcendem em muito os resultados. Como “medir” o orgulho botafoguense ou palmeirense por contemplarem, anos a fio, as estripulias de Garrincha na ponta direita ou os passes milimétricos de Ademir da Guia? Qual o peso dos elásticos de um Rivelino no auge em Fla-Flus disputados em um Maracanã, ainda maior estádio do mundo, com públicos que excediam os números de habitantes da maioria esmagadora dos municípios brasileiros? Ou ainda o orgulho de ter sido base para seleções brasileiras vitoriosas em um tempo em que o vínculo entre o torcedor brasileiro e a equipe canarinho era profundo e visceral?

Há mágicas sem as quais o futebol não teria a vitalidade que conhecemos, e que não podem ser captadas no placar de um jogo ou na classificação final de uma tabela.

Poucas coisas são tão difíceis de mensurar quanto a grandeza de um clube que é objeto de paixão e de senso de identidade de milhões de fãs. Não se trata de retórica vã ou de uma postura politicamente correta, mas do humilde reconhecimento de que a palavra final sobre uma agremiação está em sua capacidade de causar emoções nas massas.

A lista abaixo, portanto, é apenas um comparativo possível entre salas de troféus do futebol. Não uma abordagem do significado e do tamanho das instituições que estão em posse dessas conquistas.





DOS CRITÉRIOS GERAIS

 

O desenvolvimento do futebol foi complexo em nosso país, que tem dimensões continentais e cuja infraestrutura só permitiu conexões e comunicações rápidas entre seus principais centros após o processo de industrialização entre os anos 1940 e 1970. 

Houve um tempo em que os campeonatos carioca e paulista eram tudo ou quase tudo. Nos últimos quarenta anos, no entanto, esses dois colossos históricos foram gradualmente desconstruídos em prol da afirmação de campeonatos nacionais em um vínculo cada vez mais estreito com a televisão, que finalmente chegava à maioria dos lares brasileiros no fim da década de 1980.

Não faltam polêmicas nessa trajetória, dificultando sobremaneira a comparação de torneios de épocas tão distintas. Um Carioca nos anos 1950 tinha um peso completamente diferente do atual. Que dirá comparar ao longo do tempo torneios de natureza e abrangência diversa, alguns deles já extintos. 

O Brasil tem quatro grandes centros de ponta do futebol – Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e Porto Alegre –e outros cuja força intermediária foram se afirmando aos poucos. Qualquer mudança mínima de posicionamento nas polêmicas e quanto ao peso devido a cada torneio pode ser suficiente para alterar substancialmente um ranking como o proposto.

E, no entanto, é necessário se posicionar para que a brincadeira siga adiante. A primeira decisão que tomei é fazer do campeonato brasileiro criado em 1971 a principal referência para o sistema de classificação. Ele será pontuado com 100 pontos.

Dizer que o campeonato brasileiro foi criado em 1971, e não em 1967 ou 1959,  já se trata de outra tomada de posição de enorme relevância para uma lista deste tipo. Os demais torneios nacionais serão pontuados tendo por referência sua relação com o Brasileiro: se são Copas ou campeonatos nacionais de clubes, se fizeram ou não parte do processo de elaboração do Brasileirão, ou se são meros torneios nacionais complementares e de dimensão bem menor.

A pontuação de um torneio está associada a: 1) seu peso técnico; 2) prestígio; 3) abrangência geográfica; 4) importância histórica; 5) repercussão nacional. Todos estes cinco fatores foram pesados na hora de conferir número de pontos a uma competição. Por exemplo: alguns deles tinham acentuada dificuldade técnica quanto prestamos atenção aos clubes participantes, mas prestígio menor, o que levava as equipes a disputá-los de modo secundário, ou como formas de preparação para outros torneios mais desejados.

Contexto histórico é tudo, portanto.

Os vice-campeonatos recebem pontuação para valorizar as equipes que sempre estão presentes nas decisões, sinal de que realizam grandes campanhas com consistência. Mas o vice vale um décimo do valor do troféu. Se a conquista do Brasileiro representa 100 pontos, o vice recebe 10. Quando for necessário para escapar de decimais, a pontuação do vice será arredondada para cima [mas há exceções a essa regra]. Nem todo torneio recebe pontuação para o vice campeonato, caso dos títulos decididos em uma única partida.

O rebaixamento para divisões inferiores do campeonato nacional de clubes é despontuado. Trata-se de uma forma de retratar o desapontamento e o desprestígio que um clube acaba por sofrer ao passar pelo descenso. Para ressaltar ainda mais a importância do Brasileiro, pontuei a participação do clube em cada edição da divisão principal. Para a maior parte dos clubes, fazer parte da elite do Brasileiro é um privilégio, uma oportunidade rara e um imenso motivo de orgulho. 





DO PROBLEMA DOS ESTADUAIS

 

Os estaduais foram divididos em quatro grupos. 

O primeiro deles é o de maior peso, e inclui os campeonatos carioca e paulista. Foram nesses dois centros que o futebol se desenvolveu primeiro no Brasil. Foram neles também que as massas foram conquistadas e que se deu o processo de profissionalização do esporte. Os campeonatos carioca e paulista só perderam prestígio e relevância técnica a partir dos anos 1990, quando a nacionalização das principais competições, processo associado à exploração do mercado aberto pelo televisionamento e pelo consumo das faixas de renda B e C, se tornou irrefreável.

Para dar conta da ascensão, auge e queda desses estaduais, alterei a pontuação de acordo com o período histórico. 

Até 1936, foi atribuído ao campeão paulista 20 pontos e ao carioca 15. A data se justifica como marco da profissionalização e da superação dos cismas dos grandes clubes, que até então se dividiam constantemente em Ligas diferentes. Assumir a profissionalização foi também assumir que era necessário dinheiro e proximidade com o público nos estádios. E assim as principais equipes tinham de jogar umas contra as outras, criando uma dependência mútua.

Nesse primeiro período, o Paulista recebe mais pontos que o Carioca, o que pode surpreender a muitos. Mas nos anos 1910 e durante boa parte dos anos 1920 era consenso que o nível dos times paulistas era superior ao do Distrito Federal, e a diferença de pontos tenta dar conta dessa realidade histórica.

Mas a profissionalização fez com que o futebol do Rio de Janeiro assumisse a dianteira. O então Distrito Federal era a maior cidade do país, a rigor a única metrópole brasileira, e tinha mais condições de explorar o público urbano que lotava São Januário e depois o Maracanã. Além disso, a centralidade da grande mídia no Rio tornou o Carioca o primeiro torneio de repercussão nacional. As rádios veiculavam as notícias e os jogos das equipes do Rio para todo o país, inclusive para São Paulo, criando torcidas nacionalizadas. Sampa só sofreria processo parecido a partir dos anos 1990, em outro contexto e com outra mídia, a TV.

O nível técnico do Carioca também se tornou superior ao do Paulista. Nos anos 1940, o campeonato de São Paulo se tornou cenário de jogadores “aposentados” no Rio, caso de Leônidas, Domingos da Guia e Zizinho. Assim, entre 1936 e 1960, o campeão carioca passa a receber 40 pontos, enquanto o paulista recebe 30.

A industrialização e o crescimento demográfico de São Paulo logo fez com que a cidade desbancasse o Rio de Janeiro como metrópole mais populosa. No censo de 1960, o Rio perdia o posto de maior cidade brasileira, que ostentava há um século. Logo depois, também perderia a posição de Distrito Federal. No cenário do futebol, o nível técnico das equipes paulistas voltou a se equiparar às cariocas na segunda metade dos anos 1950. Essa paridade técnica duraria até o fim dos anos 1980, embora a visibilidade e a repercussão nacional do Carioca continuasse maior que a do Paulista durante todo o período. Entre 1961 e 1970, tanto o Paulista quanto o Carioca recebem 40 pontos.

Em 1971 se inaugura o Campeonato Brasileiro, o primeiro nacional de clubes independente das classificações dos estaduais. Foi também a primeira competição na história a desbancar o Carioca e o Paulista da posição de torneios mais desejados pelos próprios grandes das respectivas metrópoles. Foi a primeira minoração vivida pelos dois torneios estaduais modelo, que agora dividiam o ano com o Brasileiro, cujo status suplantou até mesmo o do Carioca no imaginário do torcedor. Mas ainda estava distante o tempo em que esses dois torneios entrariam em declínio. Entre 1971 e 1991, os campeões carioca e paulista recebem 30 pontos.

Em 1992, o fechamento provisório do Maracanã escancarou a diferença de estrutura e capacidade financeira entre o estadual de São Paulo e o do Rio de Janeiro. Sampa era uma metrópole com população 80% maior que a fluminense, o que justificou sua classificação pelo IBGE como “Grande Metrópole Nacional”, passando o Rio ao status de Metrópole Nacional ao lado de Brasília. A TV, que entrou nos lares das classes populares de todo o país ao longo dos anos 1980, levou o campeonato paulista para todos cantos do país, iniciando de modo rápido a nacionalização das torcidas do estado. Houve também uma defasagem técnica entre as competições dos dois centros, com um esvaziamento considerável dos clubes pequenos cariocas quando comparados à vitalidade do interior paulista.

Outro torneio nacional foi criado, a Copa do Brasil, e junto com o Campeonato Brasileiro, impulsionados cada vez mais pelas cotas de TV, geravam muito mais dividendos que os antigos estaduais, que entravam num processo de decadência do qual nunca mais escaparam. Entre 1992 e 2002, o Paulista leva 25 pontos, o Carioca fica com 20.

O Campeonato Brasileiro passou a ser disputado em pontos corridos a partir de 2003. A competição se estendeu por cerca de 8 meses do ano, diminuindo consideravelmente o tempo de disputa dos estaduais. O Paulista leva 20 pontos entre 2003 e 2011, e o campeão do Rio leva 15.


Com o fim do Clube dos 13 e a consolidação da TV fechada e, mais tarde, do streaming, a nacionalização do futebol brasileiro se acentuou. As competições nacionais passaram a receber cotas e patrocínios muitas vezes superiores aos estaduais. O sucesso da Copa do Brasil tornou essas cotas acessíveis a praticamente todos os clubes médios e pequenos do país. Os antigos portentos Carioca e Paulista se tornaram pouco mais que torneios preparatórios para as competições nacionais. Eles ainda mantém sua relevância histórica e alimentam as rivalidades dos clubes de maior torcida e tradição, e por isso recebem 12 pontos no caso do Paulista e 10 no caso do Carioca.

O segundo grupo de estaduais inclui Rio Grande do Sul e Minas Gerais. A profissionalização e a capacidade de mercado de Porto Alegre e Belo Horizonte se consolidaram depois de Rio e Sampa, e nunca foram suficientes para sustentar o mesmo número de clubes de sucesso no cenário nacional. Até 1960, os estaduais gaúcho e mineiro recebem 10 pontos. 

Com a criação dos primeiros torneios nacionais e o sucesso de Cruzeiro, Atlético Mineiro e, em um primeiro momento, do Internacional, a visibilidade desses centros se amplia. Em 1966, pela primeira vez a seleção brasileira deixa de ser um combinado entre os clubes de Rio e de São Paulo. Entre 1961 e 1991, estes estaduais recebem 15 pontos. Na década de 1992/2002, afetados pelo mesmo processo de esvaziamento e perda de relevância em comparação com as competições nacionais, eles voltam a receber 10 pontos. E após 2003, o campeão de RS e MG recebe 8 pontos.

O terceiro grupo é composto por centros de futebol historicamente secundários, mas que sempre foram capazes de colocar representantes nos torneios nacionais: os campeonatos de Paraná, Goiás, Santa Catarina, Bahia, Ceará e Pernambuco recebem 5 pontos. No grupo seguinte, os demais estaduais recebem 3 pontos.

Desse modo penso ter enfrentado a questão da diferença de peso entre os principais centros do futebol brasileiro bem como a alteração da importância dos próprios estaduais ao longo do tempo.

Os casos especiais continuam, no entanto, oferecendo desafios que não me dispus ainda a enfrentar. Essas dificuldades podem ser exemplificadas com a Taça Guanabara, torneio criado no Rio de Janeiro em 1965 e que era um dos maiores objetos de desejo dos clubes da cidade. A Taça Guanabara era considerada quase que como um estadual à parte, e sua conquista gerava comemorações efusivas na cidade até o fim dos anos 1990.

Desconsiderar o caso da Taça Guanabara é um desserviço histórico, mas sua excepcionalidade é também um nó difícil de desatar. Ela teria de ser comparada com outros Troféus secundários disputados nos demais centros, gerando uma celeuma enorme. Fica para um ranking futuro.





TORNEIOS ESTADUAIS


1. CARIOCA E PAULISTA


1.1 Até 1936: Carioca 15 p / Paulista 20 p

1.2 1937 a 1960: Carioca 40 p / Paulista 30 p

1.3 1961 a 1970: Carioca 40 p / Paulista 40 p

1.4 1971 a 1991: Carioca  30 p / Paulista 30 p

1.5 1992 a 2002: Carioca 20 p / Paulista 25 p

1.6 2003/2011: Carioca 15 p / Paulista 20 p

1.7 2012 em diante: Carioca 10 p / Paulista 12 p


2. MINAS GERAIS E RIO GRANDE DO SUL


2.1 Até 1960: 10 p

2.2 1961 a  1991: 15 p

2.3 1991 a 2002: 10 p

2.4 2003 em diante: 8 p


3. PR, SC, BA, PE, CE, GO

5 p


4. DEMAIS ESTADUAIS

3 p




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