Zizinho, o grande ídolo rubro-negro dos anos 1940, foi o maior jogador brasileiro antes da Era Pelé. Melhor jogador da Copa de 1950, considerado pela imprensa internacional um gênio do futebol, atuou também de meia-atacante e de centroavante. Mas foi como meia-armador que viveu seu auge Flamengo. Era tão bom que mesmo na parte final de sua carreira, já com mais de 30 anos de idade, provocava dúvidas em todos sobre quem era o melhor da posição, ele ou Didi. Falo também de um gênio e ídolo esquecido na história d'O Mais Querido, o famoso "Dr. Rúbis", que disputava vaga na seleção com Zizinho e Didi, mas que foi gradualmente deixado de lado por causa de seu comportamento boêmio e indisciplinado. Rubens é, no entanto, um dos grandes imortais do famoso Rolo Compressor que tornou o Flamengo o dono do Maracanã. Essa apresentação se dá em ordem cronológica. Para ler os textos anteriores, clique nos links no fim da postagem.
2) ZIZINHO, O ''MESTRE ZIZA'' [1939/50]
"Um gênio próximo da perfeição'' que, como Da Vinci, ''cria obras-primas com os pés na imensa tela do gramado do Maracanã”. Era assim que a imprensa internacional se referia Thomás Soares da Silva, o Thomazinho, ou Zizinho, durante a Copa do Mundo de 1950.
O Mestre Ziza, como é também conhecido, foi eleito em 1999 pela Federação Internacional de História e Estatística do Futebol como o quarto maior jogador da história brasileira. Isso o coloca pelo menos no top 5 do futebol brasileiro do século XX.
Recebeu também o prêmio de melhor jogador da Copa de 1950. Seu estilo de jogo inspirou o futebol de Pelé, que o tinha como referência e ídolo. Era o atleta brasileiro mais famoso e de maior reputação nos anos 1940 e 1950, maior talento da equipe que conquistaria o Sul-Americano ['Copa América'] de 1949, um dos troféus mais importantes da história da nossa seleção. Foi 'padrinho' e 'grande conselheiro' de Gérson 'canhotinha de ouro' no início da carreira.
Zizinho nasceu em São Gonçalo mas foi descoberto nos torneios de várzea de Niterói. Não conseguiu vaga pra jogar no América RJ, mas despertou atenção de olheiros de Flávio Costa, técnico do Flamengo.
Ainda muito jovem, aos 17 anos, se tornou titular inconteste do time que quebraria o jejum rubro-negro e conquistaria uma dos maiores títulos de nossa trajetória, o campeonato carioca de 1939, jogando ao lado de Domingos da Guia e Leônidas da Silva. Em pouco tempo se tornaria o maior destaque d'O Mais Querido.
As taças mais importantes para o Flamengo foram as do primeiro tricampeonato em 42/43/44. Na campanha do tri, o Flamengo já estava enfraquecido, sem Leônidas e Domingos. Ainda assim foi liderado por Mestre Ziza rumo à glória, conquistada em pleno estádio de São Januário nos últimos minutos da peleja.
Zizinho tinha um estilo inconfundível. Didi, que nos anos 1950 rivalizaria com ele na posição de meia da seleção, sintetizou de modo perfeito a diferença: ''eu entregava pelo Correio, o Zizinho preferia entrega a domicílio''. Ou seja, não era um meia de passes e lançamentos longos. Sua marca eram as arrancadas com dribles ziguezagueando pela defesa adversária.
Além disso, era um jogador de extrema dedicação, correndo por todos os lados do campo. Pra completar, foi também o inventor da paradinha no pênalti, depois imitada e difundida pelo mundo pelo Rei Pelé.
Único jogador a se salvar do naufrágio do Maracanaço, Zizinho estava vendido ao Bangu por causa de uma trapalhada do Presidente do Flamengo, que, interessado em montar um esquadrão, negociava a contratação do atacante Mariano, do clube da Zona Oeste do Rio. Com a intenção de se livrar dos pedidos insistentes de Guilherme da Silveira -- Presidente do Bangu e da famosa Fábrica de Tecidos, que hoje dá nome à praça em que se encontra o Estádio de Moça Bonita [Estádio Proletário Guilherme da Silveira, construído por ele mesmo] --, chutou um valor altíssimo para o passe de Zizinho. O ''Doutor Silveirinha'' bancou o valor.
A negociação foi uma das mágoas que Mestre Ziza carregou na vida, mas não o impediu de se tornar o maior ídolo e jogador da história do Bangu. Outros tempos, em que o craque de uma Copa permanecia não só jogando no Brasil mas em um clube suburbano.
Em 1957, já aos 35 anos de idade, Zizinho foi vendido ao São Paulo. Foi campeão paulista em uma temporada, vice na seguinte, e se tornou também um imortal no coração da torcida tricolor paulistana.
Ainda foi convocado para a seleção brasileira em 1953, mas foi cortado porque não concordou com a diminuição da premiação prometida aos jogadores caso conquistassem o Sul-Americano [Copa América] daquele ano. Isso lhe custou a participação na Copa de 1954: a CBD preferiu Didi para a posição. O fracasso diante da Hungria trouxe o Mestre de novo para o time nacional em 1955. Mas a derrota no Sul-Americano de 1957 convenceu os treinadores que era necessário rejuvenescer o time.
Zizinho é ainda hoje o 9º maior artilheiro do Flamengo, com 145 gols. No Brasil, foi a ponte entre Leônidas da Silva e Pelé, e maior jogador antes da Era de Ouro. No Flamengo, foi a ponte entre a construção d'O Mais Querido como um clube nacionalista e popular, nos anos 1930, e a explosão d'O Rolo Compressor, 'dono do Maracanã', nos anos 1950. 'Meia de ligação' também na história, o Mestre é presença obrigatória em qualquer Flamengo ou seleção brasileira de todos os tempos.
3) RUBENS, O "DR. RÚBIS" [1951/57]
O mal do homem é o esquecimento, disseram certa feita. No futebol, ele assume ares de crueldade extrema. Na primeira metade dos anos 1950, Rubens era carregado nos ombros pela torcida depois de recitais no Maracanã; considerado naquele momento pela crítica especializada como meia-armador de mais qualidade que Didi e Zizinho; visto pela Magnética como carrasco do Vasco; escolhido para capa da primeira edição da revista Manchete Esportiva; principal tema de programas de sucesso no rádio; homenageado em sambas clássicos de Wilson Baptista.
Hoje, poucos dentre os rubro-negros sabem quem ele foi.
O paulistano saiu dos campos de várzea para o Ypiranga, em 1947, com apenas 18 anos de idade. Encantou a todos com suas atuações pela seleção paulista. A Portuguesa de SP foi mais rápida, e o contratou em 1950, mas não conseguiu mantê-lo. Gilberto Cardoso, o imortal presidente do Flamengo, queria montar um esquadrão e deixar para trás os últimos anos marcados por fracassos. E assim, Rubens entrou na Gávea pela primeira vez em 1951.
E não foi uma entrada qualquer. Estreou contra o Vasco, rival que dominou o futebol brasileiro na segunda metade dos anos 1940 e que o Flamengo não derrotava há seis anos e 20 partidas. Naquele 16 de setembro, Rubens fez chover. Deu ritmo ao meio campo, com dribles rápidos, grande distribuição do jogo, mandou bola na trave, deu passe pra gol, e saiu do Maior Estádio do Mundo como ídolo da Nação Rubro-Negra.
Nas temporadas seguintes, o "Dr. Rúbis'' [apelido criado por personagem no programa ''Balança mas não cai''] se consolidou como o principal meia do futebol carioca. Foi também capital na revolução tática estabelecida por Fleitas Solich, que aposentou a WM/Diagonal no Flamengo e assumiu de vez o 4-2-4. Nascia o Rolo Compressor, time mítico que dominou o Rio de Janeiro e fez da Magnética a ''dona do Maracanã''.
Rubens chegou à seleção brasileira e fez parte do elenco que disputou a Copa da Suíça, em 1954. Mas não foi muito aproveitado pelo técnico Zezé Moreira, que escolheu Didi para a função. E aqui começam os problemas que levaram ao ocaso de Rubens. Uma das explicações para a preferência de Zezé é que ele jogava na Diagonal, e não no 4-2-4, como o Flamengo. Mas a verdade é que Rubens já tinha nas costas uma ampla coleção de indisciplinas por causa de seu caráter boêmio.
Fumante inveterado, que consumia três maços por dia, e com tendências ao alcoolismo, Rubens quase foi cortado da seleção. Depois de 1954, foi claramente deixado de lado pela CBD por causa do comportamento festeiro e dos dias passados na mesa de bar.
Sua situação na Gávea também não era tranquila. O disciplinador Fleitas Solich também iniciou um cerco severo ao doutor, e chegou a proibi-lo de fumar nas dependências do Flamengo. Finalmente, um 'derrame' no joelho esquerdo, em 1956, selou seu destino. Rubens foi encostado e depois emprestado ao Santa Cruz no ano seguinte.
Ainda deu a volta por cima ao retornar ao Vasco em 1958 e, com uma preparação muscular específica, conduzir o rival ao título do Rio-São Paulo e do carioca [que, lembremos, terminou no ano seguinte, depois da Copa, e é considerado por muitos como o maior da história, com Flamengo, Vasco e Botafogo empatando em primeiro lugar nos dois turnos e empatando também no primeiro triangular de desempate].
Mas era o canto do cisne. O doutor se aposentou. Foi quase totalmente esquecido. E faleceu aos 59 anos de idade por conta de um câncer de pulmão. Mas sua estrela brilha forte nos céus paradisíacos que recebem os grandes heróis d'O Mais Querido.
Seus principais títulos no Flamengo são os do tricampeonato 1953/54/55. Venceu o pan-americano de 1952 pela seleção brasileira.
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