sexta-feira, 23 de dezembro de 2022

OS 10 MAIORES JOGADORES DA HISTÓRIA, NÚMERO 2: LIONEL MESSI

 A hegemonia de Messi o levou a ser apontado quatro temporadas seguidas como o maior jogador do mundo pela France Football [um prêmio que a esta altura ele já possui 7 vezes]. Tamanha qualidade gerou especulações sobre seu peso na história do futebol, e não poucas vozes chegaram a declarar o argentino o maior de todos os tempos. A temporada de 2011/12 foi o maior exemplo das alturas que o camisa 10 do Barcelona era capaz de atingir nos gramados. Foram 73 golos em apenas 60 jogos um desempenho comparável ao do Rei do Futebol.





NÚMERO 2: LIONEL MESSI


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Messi era tão espetacular que gerava imensa expectativa quando juvenil. Diamante cujos problemas de crescimento foram resolvidos por um tratamento hormonal na Espanha, e que foi preparado pelo Barcelona desde os 13 anos para se adequar ao esquema, mentalidade e estilo de jogo do clube, foi ancorado no início da carreira profissional pelo sucesso de Ronaldinho Gaúcho.


Uma vez chegando ao time titular, no entanto, não demorou muito para que o meia-atacante se tornasse a principal figura de uma equipe que acabou fazendo história não só por sua dominância na Europa ou pela qualidade de seu futebol, mas por representar uma revolução tática, o tiki taka. Foi este estilo de jogo implementada no Barcelona que levou a Espanha, que possuía boa parte de sua espinha dorsal formada por atletas do clube, ao seu primeiro e tão esperado título mundial. Messi é o símbolo máximo dessa equipe e dessa filosofia, um time imensamente compactado, de jogadores que giravam em posições de ataque e que, mantendo a posse de bola com passes curtos, exibia um futebol de imensa pressão sobre o adversário, capaz de fazê-lo correr atrás da bola como numa roda de bobo até ser levado à exaustão. Se Ronaldinho Gaúcho representou a definitiva ressurreição da figura do ponta, Messi elevou à perfeição a figura de "Falso Nove", cujos protótipos já podiam ser vistos em Puskas, na Hungria de 1954. 


A habilidade do argentino de conduzir a bola em alta velocidade e grudada no pé, com dribles curtos e trespassando como um raio a linha de defesa dos adversários, se tornou quase que lendária. Talvez fosse menos espetaculoso que Ronaldinho Gaúcho, a referência do Barça antes do argentino, mas sua eficiência era maior sem perder nada em beleza. Além disso, Messi se tornou um dos mais mortíferos atacantes do futebol mundial, um artilheiro sem piedade, cujos recordes de golos na Europa e futebol decisivo o tornaram comparado a Maradona e Pelé.


A hegemonia de Messi o levou a ser apontado quatro temporadas seguidas como o maior jogador do mundo pela France Football [um prêmio que a esta altura ele já possui 7 vezes]. Tamanha qualidade gerou especulações sobre seu peso na história do futebol, e não poucas vozes chegaram a declarar o argentino o maior de todos os tempos. A temporada de 2011/12 foi o maior exemplo das alturas que o camisa 10 do Barcelona era capaz de atingir nos gramados. Foram 73 golos em apenas 60 jogos um desempenho comparável ao do Rei do Futebol.


A caminhada de Messi para o posto de maior nome do esporte mais popular da história foi obstaculizada, no entanto, por causa do segundo aspecto de sua jornada, aquele que colocou uma pulga atrás da orelha dos fãs d'A Pulga, como Lionel é chamado por causa do físico frágil. Seu desempenho no clube, até então sem paralelo, passou a ser cada vez mais comparado com o do atacante português Cristiano Ronaldo, que depois de imenso sucesso pelo Manchester United, chegou ao Real Madri, maior rival do Barcelona, para disputar o reinado de Messi. 


O número 7 desafiou o número 10, e foi mais bem sucedido em quatro das cinco temporadas que se seguiram a 2012, empatando o número de prêmios conferidos pela FIFA ao melhor da temporada, um recorde que era um dos maiores sinais da imensidão técnica de Messi. O status de artilheiro e de jogador decisivo do argentino também se tornou alvo de golpes do rival, que ultrapassou sua absurda média de golos e causou confusão na mídia e no público ao levantar a questão de quem seria melhor, Messi ou Cristiano.


A vida de Messi não era menos complicada na seleção nacional. O argentino convivia com a sombra do magnífico Diego Maradona, imbatível no coração do torcedor portenho. Mesmo que tenha se tornado o maior goleador da Albiceleste, Lionel não conseguia colocar fim ao incômodo jejum de títulos que constrangia nossos hermanos, e que beirou os trinta anos. A medalha olímpica de 2008 e as dezenas de tentos com a camiseta da equipe pátria não mitigaram os fracassos recorrentes que acompanham o camisa 10 portenho tanto em competições continentais quanto na Copa do Mundo. Desde 2007, quando amargou o vice-campeonato da Copa América diante da seleção brasileira, até as duas finais seguidas perdidas nos penais para o Chile, em 2015 e 2016, as decepções se acumularam ao ponto dele anunciar que deixaria a seleção, decisão da qual se arrependeu e voltou atrás após pedidos de seus compatriotas.


O maior espinho no dorso de Messi era a Copa do Mundo. Ainda que tenha conquistado um polêmico prêmio de melhor jogador de 2014, ocasião em que a Albiceleste chegou à final no Maracanã e saiu derrotada pelos alemães, Lionel não conseguia traduzir seu status de gênio para os gramados do mais importante e definidor evento esportivo do planeta. Participou de quatro Copas sem conseguir marcar em jogos eliminatórios ou contra seleções de peso e tradição, A Pulga sempre pareceu sair da Copa devendo, abaixo do que poderia render e sem suprir as expectativas em torno do seu nome.


Todas essas dúvidas se dirimiram neste ano de 2022. Aos 35 anos de idade, Messi conduziu a Argentina ao tricampeonato mundial no Qatar, com uma performance que beirou a perfeição, disparada a sua melhor em Copas, e que lhe garantiu o posto de maior jogador do torneio -- se tornando o primeiro atleta a conquistar o prêmio em dois Mundiais diferentes. Era o título que faltava para colocá-lo no nível em que muitos sempre apostaram que chegaria e que já lhe conferiam antes mesmo que os troféus com a Albiceleste se concretizassem. 


É provável que os argentinos continuem por muito tempo ainda considerando Diego Maradona o melhor jogador do país. Mas para o restante do planeta já não há dúvidas que a carreira d'A Pulga é superior, tanto em clubes quanto na seleção.  Messi abateu todos os leões que a carreira lhe colocou.  Sua técnica apurada, sua capacidade de definição de partidas e campeonatos, o posicionam na lista apenas atrás do Rei Pelé.

OS 10 MAIORES DA HISTÓRIA, NÚMERO 3: DIEGO MARADONA

 Aos 25 anos, realizou em gramados mexicanos a performance mais assombrosa que um jogador já havia feito em uma Copa, superando a de Garrincha em 1962 e, coincidentemente, assim como a do brasileiro, lembrada pelo desempenho e gols nas Quartas-de-Final contra os ingleses. Longe de ser apenas um mês inspirado, Maradona continuou demonstrando no campeonato italiano a magnitude esplendorosa que capturou a imaginação de todos no Mundial. Com uma movimentação anárquica e imarcável, dribles em velocidade, verticais e em todos os pontos do gramado, Maradona era ao mesmo tempo um fenômeno da natureza e a síntese da cultura latino-americana. 




NÚMERO 3: DIEGO MARADONA


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''El Pibe de Oro'' foi o jogador de carreira mais apaixonante que tive o prazer de acompanhar. Havia uma grande dúvida em meados dos anos 1980 sobre o melhor jogador do mundo. Os preferidos eram Zico e o francês Michel Platini. Maradona vinha atrás, considerado menos objetivo do que os dois primeiros.


Toda e qualquer discussão chegou ao fim em 1986, quando Diego alcançou a maturidade de seu futebol. Aos 25 anos, realizou em gramados mexicanos a performance mais assombrosa que um jogador já havia feito em uma Copa, superando a de Garrincha em 1962 e, coincidentemente, assim como a do brasileiro, muito lembrada pelo desempenho e gols nas Quartas-de-Final contra os ingleses. Longe de ser apenas um mês inspirado, Maradona continuou demonstrando no campeonato italiano a magnitude esplendorosa que capturou a imaginação de todos no Mundial.


A carreira de Maradona está repleta de aspectos que transcendem o âmbito esportivo de um modo ainda mais explícito do que o de outros craques, alguns já debatidos quase à exaustão: os elementos geopolíticos e patrióticos de sua atuação contra a Inglaterra no México, incluindo aí ''La Mano de Díos'' e o ''gol do século''; as declarações socialistas e amizade com Cuba e Fidel Castro; suas possíveis ligações com a Cosa Nostra; suas observações sobre as diferenças entre o Norte e o Sul da Itália em plena disputa do Mundial de 1990, pouco antes da semifinal contra a Azzurra; as acusações à FIFA pela perda da Copa e pela falta de reconhecimento de sua grandeza; os problemas com a cocaína, que resultaram em reviravoltas dramáticas na imagem do craque; a identificação fora do comum com as classes populares argentinas, que viam em sua vida uma expressão acabada da alma do país.


Não há palavras para descrever o impacto que Maradona causou na minha geração. Ainda garoto, acompanhei todas as partidas da Argentina no México. Dom Diego era um deus vivo, quebrando toda a lógica do futebol com uma movimentação anárquica e imarcável por todo o campo adversário. Seus dribles em velocidade, verticais e em todos os pontos do gramado, eram o sonho de todo menino que corria atrás da bola. Ao mesmo tempo um fenômeno da natureza e a síntese da cultura latino-americana. Maradona era impossível de enquadrar, se tratava de um demônio destruindo esquemas e certezas. Em uma época em que pouco tínhamos interesse nos campeonatos de outros países, assistíamos o italiano para contemplar a mágica do camisa 10 do Napoli passar por cima de toda minuciosa arquitetura dos maiores sistemas defensivos já criados.


Diego foi o único a polarizar com a figura dominante de Pelé e manter a pulga atrás da orelha de muita gente mesmo depois que seus anos áureos passaram. Lembro de um repórter na Copa de 1986 perguntando ao Rei do Futebol se o camisa 10 argentino era o ''novo Pelé''. Ele pensou alguns segundos e emendou, ''o de 1986, sim!''


Ainda hoje se discute em alguns meios sobre quem foi o maior talento individual. Mas para a maioria de nós, Pelé foi mais completo, já que possuía todos os fundamentos, batia com as duas pernas, um jogo aéreo superior e mais presença de área. Era tão espetacular quanto Diego, e mais objetivo, mais mortífero, e também mais duradouro.


Ainda assim, Maradona permanece como o espetáculo mais singular que o futebol foi capaz de ofertar, desde as demonstrações de habilidade e domínio da pelota que dava nos aquecimentos das partidas até a figura desviante e autêntica que acompanhávamos fora das quatro linhas.


Sua personalidade vibrante e polêmica, encarnação do talento e da psique popular, seu temperamento indomável, impedem qualquer imparcialidade quando se trata de analisá-lo. Diferente de Messi, ídolo das novas gerações, Maradona era a anti-tática, a paixão unida ao trágico. Se os fãs de Messi lamentam a falta de condições ideias para que o craque do Barcelona renda tudo o que pode, Diego fazia questão de suplantar as restrições que o time e o contexto lhe impunham. 


Maradona era uma revolução solitária desafiando a ordem planejada pelos melhores treinadores e implantada pelas equipes mais gabaritadas. Sua posição na lista seria mais alta caso eu fosse argentino.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2022

OS 10 MAIORES JOGADORES DA HISTÓRIA, NÚMERO 4: JOHAN CRUYFF


Cruyff foi a síntese de duas características que se tornaram essenciais para o orgulho futebol do Velho Mundo: liderou um time que colocou fim à idéia de que apenas os times sul-americanos jogavam de maneira técnica e habilidosa; e criou uma revolução tática no jogo que está na base do nascimento de sua fase moderna.




 NÚMERO 4: JOHAN CRUYFF


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Cresci lendo, ouvindo e considerando Johan Cruyff o maior jogador europeu da História. Depois de ficar em dúvida por causa da ascensão de Zidane, recoloco o holandês em sua posição de direito. Ainda assim, ele permanece fora do top 3 por não ter conquistado uma Copa do Mundo.


Cruyff foi a síntese de duas características que se tornaram essenciais para o orgulho futebol do Velho Mundo: liderou um time que colocou fim à idéia de que apenas os times sul-americanos jogavam de maneira técnica e habilidosa; e criou uma revolução tática no jogo que está na base do nascimento de sua fase moderna.


Para a Holanda, ele representa a ascensão ao primeiro escalão do futebol mundial. O país que era até então nada no mundo da bola foi capaz de formar uma geração que chegou a duas finais seguidas de Mundiais. O Ajax, por sua vez, liderada pela mítica camisa 14, se tornou tricampeão europeu, desbancando os times italianos.


O Futebol Total da Holanda de 1974 apresentou ao mundo jogadores que não possuíam uma posição definida, que giravam pelo campo, trocando de funções, e apresentando ao planeta a marcação pressão em bloco alto e o uso perfeito da regra do impedimento. Era um time caracterizado pela versatilidade e pela intensidade física. Algumas performances daquele time e de seu meia-atacante estão entre as mais assombrosas que já se viram em um Mundial, como a demolição da Argentina por 4 a 0 seguida da superação da seleção brasileira comandada por Zagallo, e então campeã do mundo, por 2 a 0.


Cruyff nunca mais disputaria outra Copa. Durante muito tempo se acreditou que sua ausência na Argentina, em 1978, teria se dado por um posicionamento político contrário ao regime ditatorial. Recentemente, no entanto, o ídolo holandês declarou que a principal causa para sua desistência teria sido um sequestro relâmpago que sua família sofreu na Espanha meses antes da disputa do torneio. Outra versão seria uma promessa feita à sua mulher, a quem traiu de modo mais ou menos público quando do Mundial na Alemanha.


O camisa 14 também marcou época no Barcelona, levando o clube catalão a quebrar um jejum de catorze anos sem títulos da Liga Espanhola. 


Depois de anunciar a aposentadoria aos 30 anos de idade, Cruyff voltou aos gramados para substituir Pelé na liga americana. Atuou ainda na segunda divisão espanhola e venceu mais campeonatos holandeses no início dos anos 1980 antes de colocar fim à gloriosa carreira.


Johan Cruyff talvez seja o símbolo máximo da inteligência tática. Na eleição de melhores jogadores do século XX da Federação Internacional de História e Estatística do Futebol, realizada com consulta a jornalistas e jogadores, o holandês ocupou a segunda posição da lista final, abaixo apenas de Pelé.


Sua passagem pelos campos teve o brilho do famoso ''giro de Cruyff'', o drible que imortalizou e que passou a ser associado ao seu nome a partir de então. E sua história no esporte teria continuidade com portentosas contribuições como técnico e uma voz sempre ativa na defesa dos estilos das escolas nacionais. Sempre foi um grande crítico ao abandono dos pontas e insistiu até o fim que a Holanda atuasse de maneira propositiva. O jogador tático e revolucionário era um grande conservador em questões de identidade de jogo.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

OS 10 MAIORES JOGADORES DA HISTÓRIA, NÚMERO 5: ALFREDO DI STÉFANO

Depois de uma briga entre Barcelona e Real Madri, em que a FIFA e o governo espanhol meteram a colher, foi parar no clube da capital, sendo o principal responsável por torná-lo sinônimo de grandeza e soberania no futebol. A Flecha levou o Real Madri a oito títulos na Liga Espanhola e a cinco títulos consecutivos na Liga dos Campeões, marcando gols em todas as finais. Fez do clube também o primeiro campeão mundial interclubes e se tornou para todos o ''Pelé antes de Pelé'', símbolo de completude técnica e tática.




NÚMERO 5: ALFREDO DI STÉFANO


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Entre os poucos que acompanham essa série de postagens há aqueles que esperam ver no top 5 da lista de dez maiores o nome de algum dos grandes ídolos da última década e meia, o ponta de lança Lionel Messi e o atacante Cristiano Ronaldo. Para estes faço alguns comentários que considero pertinentes.

Assim como em outras áreas, existe no futebol uma dinâmica der memória e esquecimento. Quando comecei a jogar peladas nos campinhos de terra e nas ruas de Senador Camará ainda na primeira metade dos cada vez mais longínquos anos 1980, a grande discussão sobre maior jogador de todos os tempos polarizava Pelé e Garrincha. Nós crianças repetíamos o que ouvíamos dos adultos, em quem a imagem de Mané, falecido por aquele tempo e que havia se retirado dos gramados há apenas dez, quinze anos, ainda se encontrava muito vívida. Diziam que ele era até melhor do que o Rei, mas não teve a ''cabeça'' de Pelé, não soube administrar a carreira.

Esse tipo de tema foi quase que totalmente apagado do debate público no futebol pátrio durante os anos 1990. Naqueles tempos a figura de Mané se embotou diante da de Zico, da ascensão de Romário, do Fenômeno etc. Ele saiu do topo da lista dos melhores entre os analistas do esporte a tal ponto de eu ficar um tanto surpreso quando na segunda metade daquela década um importante articulista escrever sobre seu desapontamento com o embotamento da imagem de Garrincha.

Esse esquecimento de Mané durou uns quinze anos. A partir do fim da década passada, a figura dele tem sido cada vez mais relembrada, engrandecida. É como se houvesse um estalo na ''memória coletiva'' -- expressão problemática, eu sei -- que trouxesse à tona mais uma vez a importância e excepcionalidade do ponta. Memória, esquecimento, memória.

Na segunda metade dos anos 1980 o grande debate era sobre Zico e Maradona. Quando Zico se despediu do futebol, na virada dos anos 1980 pros 1990, deixou os gramados com a aclamação de que havia sido o maior jogador brasileiro depois de Pelé. O próprio Rei acredita nisso. Em todas as entrevistas em que o vi se pronunciar sobre o assunto, inclusive declarações nessa década atual, Pelé diz que o jogador que mais chegou próximo dele no Brasil foi Zico. Telê Santana afirmou a mesma coisa em 1989, que o camisa 10 da Gávea havia sido o maior depois do Rei do Futebol. A grande discussão naqueles tempos de Diego Maradona era sobre quem havia sido melhor, se o Galinho ou o Moleque de Ouro. Muricy Ramalho deu entrevista recente no Sportv afirmando que considera Zico melhor do que Messi e até Maradona, e chegando a soltar um riso irônico quando lhe pediram pra comparar o ídolo rubro-negro a Cristiano Ronaldo.

Pois na segunda metade dos anos 1990 essa discussão também começou a se esvanecer diante da conquista de novas Copas pela seleção e do surgimento de Romário, que polarizou opiniões e brigas com Zico. No cenário mundial, a figura de Zico também se obscureceu nos anos 2000, e hoje já é comum que não se coloque o Galinho nem no top 10 dos melhores de todos os tempos -- algo que seria muito difícil nos anos 1980. Memória, esquecimento, memória.

É absolutamente comum na história do futebol que os ídolos da geração presente, ainda em atuação, sejam considerados sucessores dos grandes do passado, como sujeitos capazes de desafiá-los. Aconteceu com os grandes jogadores de todas as décadas que vivenciei. Romário terminou a carreira se dizendo inferior apenas a Pelé. Ronaldo Fenômeno a iniciou sendo comparado ao Rei-- e eu devo admitir que a memória do Fenômeno vem se agigantando com o passar do tempo, e que já se tornou muito comum considerá-lo entre os dez maiores num processo contrário ao que aconteceu com Zico, por exemplo, ou da oscilação que houve com Garrincha.

Essa longa introdução me leva ao quinto colocado da minha lista de melhores. Peço permissão pra mais uma vez partir da minha experiência pessoal. Nas discussões sobre futebol na segunda metade dos anos 1980, nas classificações feitas por analistas e publicações esportivas, ninguém, absolutamente ninguém tiraria Alfredo Di Stefano do top 3. O argentino naturalizado espanhol já havia se despedido dos gramados há vinte, vinte e cinco anos, mas continuava celebrado como o maior de todos depois de Pelé. O próprio Rei, quando queria espezinhar Maradona, brincava que primeiro os argentinos tinham de decidir quem havia sido o melhor do país, se Diego ou Di Stefano.

Pelé sabia que essa dúvida não existia somente na Argentina. Quando o ano 2000 se aproximou, as mais respeitadas publicações e organizações do futebol confeccionaram listas dos principais jogadores do século. A FIFA realizou uma eleição em que participaram dirigentes da entidade, técnicos, ex-jogadores e jornalistas de todo o mundo. Di Stefano ficou em segundo lugar, atrás apenas de Pelé e curiosamente à frente de Maradona. [Uma anotação interessante: Zico e Garrincha estavam entre os dez primeiros, empatados com o mesmo percentual de votos.]

A Federação Internacional de História e Estatísticas do Futebol [IFFHS] também fez sua lista, e Di Stefano conquistou o quarto lugar, também à frente de Diego Maradona. Na eleição realizada pela prestigiosa France Football, que distribui anualmente a famosa ''Bola de Ouro'', Pelé foi escolhido o jogador do século XX. Di Stefano ficou em quarto lugar, atrás de Maradona e Cruyff.

E, no entanto, na última década e meia houve um certo apagamento da figura de Di Stefano nos debates, um processo mais ou menos semelhante ao ocorrido com Garrincha nos anos 1990 e 2000. Não acredito que esse esquecimento vá durar muito, principalmente com o aumento da importância dos campeonatos continentais europeus e do ocaso cada vez mais próximo de Lionel Messi e Cristiano Ronaldo, objetos atuais das paixões da torcida e do marketing esportivo. É bem possível que na próxima década a imagem da ''Flecha Loira'' retorne com força ao seu devido lugar.

Di Stefano era muito jovem quando surgiu no River Plate, que possuía um dos melhores elencos já vistos. Sem lugar na panelinha d'A Máquina, partiu para a Colômbia, onde foi descoberto pelos espanhóis. Depois de uma briga entre Barcelona e Real Madri, em que a FIFA e o governo espanhol meteram a colher, foi parar no clube da capital, sendo o principal responsável por torná-lo sinônimo de grandeza e soberania no futebol. A Flecha levou o Real Madri a oito títulos na Liga Espanhola e a cinco títulos consecutivos na Liga dos Campeões, marcando golos em todas as finais. Fez do clube também o primeiro campeão mundial interclubes.

Sim, Di Stefano era líder de panela, um verdadeiro ditador no Madri, uma característica comum no mundo da bola e ainda mais entre desportistas argentinos. Quem quisesse jogar no time tinha de se enquadrar e aceitar o comando do camisa 9. Puskas se adequou às regras e ao papel de astro menor a gravitar ao redor do argentino; o nosso Didi, melhor da Copa de 1958, não aceitou, brigou, e voltou ao Brasil acusando Di Stefano de ter inveja de seu futebol. Além disso, o Real Madri acabou por se tornar também uma arma da propaganda franquista, o que muitos não perdoam.

Tudo isso é verdade, mas não toda verdade. Em campo, Di Stefano correspondia a todas as expectativas, com muitos tentos, vitórias, títulos e exibições épicas. Ele se tornou para todos o ''Pelé antes de Pelé'', símbolo de completude técnica e tática. Não possuía a habilidade e genialidade do Rei, ou de Maradona e Messi, mas foi o verdadeiro divisor de águas entre o futebol amador e a revolução tática que levaria à modernidade do esporte bretão. Ele foi o futebol total antes que a expressão fosse inventada. Era um centroavante que girava por todo o campo, caindo por ambos os lados, atuando em todas as posições do meio para a frente, e se destacando também como armador. Diziam que ''jogava de área a área''. Não era apenas goleador, mas grande passador e arquiteto de jogadas de ataque. Um jogador completo nos fundamentos, na movimentação, e pioneiro na capacidade física e atlética.


Infelizmente , nunca jogou um Mundial de seleções. E notem aqui a diferença entre ele e outros grandes ídolos que não se destacaram no maior dos eventos esportivos: A Flecha nunca teve a oportunidade. A Argentina decidiu não disputar as Copas de 1950 e 1954. Di Stefano se naturalizou espanhol em 1956, já com trinta anos de idade, mas a Espanha, que estava longe de ser uma potência no futebol, ficou de fora da Suécia por causa de apenas um ponto nas Eliminatórias. Em 1962, já com Puskas naturalizado, a Fúria foi ao Chile. Mas uma contratura muscular impediu que Di Stefano jogasse a fase de grupos. Os espanhóis não deram sorte, caíram junto com o Brasil e foram eliminados. E assim, Di Stefano não teve possibilidade de atuar em nenhuma partida de Copa do Mundo.

Se tivesse jogado, sua posição nessa lista poderia ser maior ou menor de acordo com o que fizesse. Sem poder atuar, no entanto, o que restam são especulações. Mas por sua completude, pelo testemunho dos que o viram, pelo impacto em seu tempo, pelos recordes, pela importância no desenvolvimento do esporte, e principalmente por ter triunfado sobre o tempo e o esquecimento, Di Stefano não pode ser retirado do topo da lista.

OS 10 MAIORES JOGADORES DA HISTÓRIA, NÚMERO 6: MANÉ GARRINCHA

 A chave para que se conviva bem com o paradoxo de Garrincha está em uma declaração de Tostão. Ao falar dos melhores jogadores brasileiros depois de Pelé, ele confessou que sempre ficava em dúvida entre Zico, Ronaldo e Romário. E depois emendou, ''e Garrincha, mas Garrincha era um caso à parte''. Ele representa uma completude e perfeição diferente da camisa 10 de Pelé: duas perfeições distintas, que quando unidas permaneceram invictas na seleção brasileira




NÚMERO 6: MANÉ GARRINCHA



Uma das características dos grandes gênios é a capacidade de atuarem numa área mais ampla do campo, e daí a profusão de meio campistas ou meia-atacantes entre eles. A qualidade da armação, do passe, da criatividade, da movimentação, do controle do ritmo do jogo e da infiltração mortífera na área são as marcas do craque diferenciado. Como explicar então a presença de Mané nesta posição da lista, um atleta que atuava numa faixa mais restrita, do lado do campo, driblando e cruzando da ponta direita, sem se destacar também pelo número de gols? Há um grande mistério neste caso.

A chave para que se conviva bem com o paradoxo de Garrincha está em uma declaração de Tostão. Ao falar dos melhores jogadores brasileiros depois de Pelé, ele confessou que sempre ficava em dúvida entre Zico, Ronaldo e Romário. E depois emendou, ''e Garrincha, mas Garrincha era um caso à parte''.

A via para o enigma consiste em aceitar que Garrincha é um caso à parte, que não pode ser compreendido por análises, critérios, hierarquias rígidas e calcificadas, assim como um drible não será nunca reduzido à sua eficiência ou funcionalidade para equipe -- ainda que a tenha.

O drible desmonta esquemas: fator de instabilidade, de improviso, abre o rol das possibilidades ordenadas, cercadas e catalogadas por táticos e estrategistas. Mas é também um chamado ao duelo individual, ao confronto direto tendo o sol nos pés, que causa expectativa quando se apresenta e furor e êxtase quando se resolve. Acrescente a isso sua natureza pueril, moleque, de brincadeira, de coisa arteira.

E o drible é orgulho porque também humilha o adversário, sua travessura é marca de desrespeito aos limites e também de superioridade patente. É a magia mais venerada pelo antigo Maracanã -- junto àquela do gol --, e também o espírito mais conhecido do futebol brasileiro.

Foi com essa magia que Garrincha conquistou passagem no Botafogo, e não com um gol ou um passe eficiente: ele meteu a bola pelo meio das pernas de Nílton Santos, que nunca havia tomado um ''ovinho'' em toda sua vida. Aquele que foi chamado de "Enciclopédia do Futebol" na Era de Ouro do futebol brasileiro intercedeu com os dirigentes, garantindo que o mago Garrincha devia ser contratado de qualquer maneira, mesmo que sua evidente deficiência física parecesse, em um primeiro olhar, incapacitá-lo para o esporte.

Foi o drible que o tornou um deus de estirpe diferente da de Pelé, e tão adorado pela população brasileira quanto o Rei. ''Alegria do Povo'', ''Anjo das pernas tortas'', que chamava todo e qualquer marcador de ''João'', que no momento crucial de sua consagração na Copa de 1962, a chamou de ''campeonato mixuruca'', brincando com a rapidez do torneio e dizendo que ''o campeonato carioca era mais difícil''.

É nesse sentido que se entende a posição de Garrincha na lista. Ele representa uma completude e perfeição diferente da camisa 10 de Pelé: duas perfeições distintas, que quando unidas permaneceram invictas na seleção brasileira, que nunca saiu derrotada de campo quando os dois foram escalados juntos.

Mané era uma expressão do malandro e do ingênuo no brasileiro. Criança vitimada por pólio na infância, vinda do interior fluminense para a capital do país, não podemos dizer que era profissional no sentido estrito do termo: gostava de farras, bebidas e garotas de fama dúbia. Assinava contratos em branco, jogava com injeções, faltava aos treinos.

É difícil visualizar o poder e fascínio que essa mistura era capaz de exercer no gramado. Um jornalista francês declarou certa feita que Mané havia sido o jogador mais sensacional que havia visto jogar, que chegou a presenciar um lateral na Copa do Mundo andando pra trás diante dele, de tanto temor do drible -- naquela postura que nós 'peladeiros' descrevemos como "matando barata com os pés'', e que demonstra que o marcador está em dificuldades diante de seu oponente --, até sair pateticamente do gramado. O mesmo temor que fez Gérson brigar com o Flamengo, clube que o formou, depois de ter sido escalado para marcar o ponta do Botafogo em um clássico no Maracanã. ''Estão querendo acabar com minha carreira'', esbravejou o Canhotinha de Ouro.

Era um mágica da qual seus colegas de time possuíam plena consciência. Depois que a seleção tomou o primeiro gol da partida na final contra a Suécia, em 1958, Didi pegou a bola na rede brasileira e foi andando com ela debaixo do braço, dando uma bronca em todo o escrete. O time estava nervoso, intimidado pelos anfitriões e pelo momento histórico. Mas não foi a bronca que resolveu o problema, como o próprio meia e melhor jogador daquela Copa confessou mais tarde. Didi disse que durante o caminho entre a área e o meio campo, em que daria uma nova saída para o jogo, ele só tinha uma ideia na mente para recuperar a confiança da equipe: ''eu só pensava em pegar a bola e lançar o Garrincha na direita''. Vejam as imagens, foi exatamente o que ele fez.


Didi repetia ali a estratégia elaborada pelo técnico Vicente Feola no jogo decisivo na fase de grupos, contra a União Soviética. Diziam que a equipe eurasiática era uma máquina de futebol científico que pararia o Brasil. Feola chamou Didi no canto e explicou que a seleção focaria o jogo em Garrincha nos primeiros minutos. A intenção era óbvia, desmoralizar o adversário, encurralá-lo mentalmente por meio dos dribles de Mané. A exibição de Garrincha nos cinco primeiro minutos do jogo contra os soviéticos é considerada pela imprensa mundial um verdadeiro primor. Um ciclone, uma tsunami se abateu sobre os apavorados soviéticos, que presenciaram em um curto espaço de tempo toda a magia de Garrincha driblando, chutando bola na trave, e fazendo cruzamento para gols de Vavá. André Lerond, lateral esquerdo francês que marcou Garrincha na semifinal de 1958, concedeu entrevista a um jornal brasileiro nos anos 1990 expressando o mesmo sentimento: para um defensor, enfrentar Garrincha inspirado era como descer aos infernos por 90 longos minutos. Ao lado de Didi, Pelé e Nílton Santos, Mané foi eleito para a seleção daquela Copa. Mas o melhor ainda estava por vir.


O mesmo poder mágico se manifestou para o ''English Team'' nas quartas de final da Copa seguinte, no Chile. Mané estraçalhou com o jogo, os ingleses simplesmente não conseguiam encontrá-lo, pará-lo, marcá-lo. Ele driblava um inglês, e outro, e outro; a cobertura chegava, os ingleses voltavam, só para serem driblados de novo e de novo. Ele mostrou que o Brasil era superior aos demais mesmo jogando sem o maior da história em campo, pois Pelé estava machucado. Deu outro significado ao termo 'recital', a tal ponto que o técnico inglês resumiu para a imprensa de seu país a razão da queda da Albion diante do ''escrete de ouro'' brazuca: ''Eles tem Garrincha, nós não''. Aquela exibição de Mané é considerada por muitos como a maior de um atleta em uma partida de Copa do Mundo.


Conclusão semelhante a do próprio Nílton Santos, que certa feita declarou sobre a conquista de 1962: ''essa Copa eu não ganhei, foi o Garrincha que ganhou pra mim." Teríamos de esperar 1986, o ano de Maradona, para ver um atleta jogar mais em um Mundial do que Garrincha no Chile. Sem Garrincha, é provável que o Brasil não tivesse passado sequer pela fase de grupos. Teria sido eliminado pela Espanha.


Expulso na semifinal do Mundial por ter dado um pontapé debochado no traseiro de um jogador da equipe adversária -- um verdadeiro ''pé na bunda'' --, o camisa número 7 acabou jogando a decisão porque dirigentes brasileiros fizeram sumir a súmula do árbitro. A FIFA deixou rolar. Ninguém reclamou. Ninguém queria nem se arriscaria retirar aquela força do outro mundo, aquele sujeito com um sexto sentido, da final de uma Copa. Alegria do Povo, e de todo e qualquer Povo, de fato. Os jornais chilenos não reclamaram, preferiam se perguntar nas manchetes: "De que planeta veio Garrincha?" E assim, Mané se tornou o primeiro a ser, em um mesmo Mundial, campeão, artilheiro e eleito o melhor jogador. Um feito que só foi repetido pelo argentino Mario Kempes, em 1978; e pelo italiano Paolo Rossi, em 1982.


Sua vida não esteve imune à tragédia, exposta de modo doloroso em público. Foi marcado pela separação da primeira mulher e de seu romance com Elza Soares, mulher que a torcida culpou pela decadência do astro, como se ela fosse uma Lilith a se aproveitar da inocência adâmica, levando-a à Queda.

Mas ainda que aparentemente derrotado pelo álcool e pela idade, pela esperteza dos que se aproveitaram de seu auge, pelas ''infiltrações'' de uma interessada medicina esportiva, pela perda de velocidade que tornava cada vez mais inócua a travessura de seu drible, o Anjo das pernas tortas nunca deixou o coração dos brasileiros, e nenhum golpe mundano pôde jamais desvincular sua imagem do sorriso.


Sua carreira em clubes não goza de menos mágica, embora não seja recheada dos grandes troféus por ter enfrentado o Santos de Pelé em seu absoluto auge técnico e atlético. Ainda assim, muito da mística e do perene reconhecimento que o Botafogo tem dentro e, principalmente, fora do Brasil se deve às atuações de seu camisa 7. Tive um conhecido gaúcho, nascido na Argentina, e botafoguense de coração, que me explicou certa feita seu amor pela equipe de General Severiano: "é o time da Estrela Solitária", me disse apontando o escudo, "e essa Estrela Solitária é, ao mesmo tempo, Garrincha".


Eis o mistério e o espírito do Maracanã. Eis a alma do nosso futebol. O futebol moleque. O futebol de Garrincha.

terça-feira, 20 de dezembro de 2022

OS 10 MAIORES JOGADORES DA HISTÓRIA, NÚMERO 7: ZINÉDINE ZIDANE

 O 7º lugar na lista dá a dimensão da qualidade extraordinária de um dos grandes meia-armadores [ou "maestros", como dizem os italianos] já vistos, e um dos grandes responsáveis pelo sucesso de duas variações do 4-5-1, a família de esquemas táticos mais influente dos últimos trinta anos. A história de Zidane é indissociável da seleção francesa. Ele fez o país se esquecer um pouco do genial Michel Platini, abandonar o posto secundário que ocupava no futebol mundial, e ganhar uma Eurocopa, mais uma vez com um tento decisivo de seu principal jogador. Zidane fez da França uma potência.




NÚMERO 7: ZINÉDINE ZIDANE


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Reconsiderei a dimensão de Zidane na minha lista, tirando-o do top 5 e do posto de maior jogador europeu da História. Nada contra Zizou, apenas apuração dos critérios e uma reflexão mais atenta sobre seu papel nos Mundiais de 1998 e 2006. No primeiro caso, não fez uma Copa espetacular, mas decidiu o título na final. No segundo caso, teve um dos maiores desempenhos de um jogador na história das Copas do Mundo durante a fase eliminatória, mas não a decidiu a favor dos "Azuis".


De todo modo, o sétimo lugar na lista dá a dimensão da qualidade extraordinária de um dos grandes meia-armadores [ou "maestros", como dizem os italianos] já vistos no universo da bola, e um dos grandes responsáveis pelo sucesso de duas variações do 4-5-1, a família de esquemas táticos mais influente dos últimos trinta anos: o 4-3-2-1, de 1998; e o 4-2-3-1, de 2002.


Lembro que os franceses possuíam muita expectativa com a participação de Zizou em 1998. A França possuía um time contestado: uma linha de defensores muito forte com um meio e ataque bastante mediano em termos internacionais. Mas Zidane era astro da Juventus campeã mundial em 1996 e despertava esperança.


Depois de um bom início de Copa, o principal jogador da seleção francesa foi expulso no terceiro jogo da fase de grupos. Ficou de fora da grande batalha de oitavas de final contra o Paraguai, e que terminou com a vitória dos Azuis com um gol de ouro no último minuto da prorrogação. O adversário da fase seguinte foi a poderosa Itália, que se entrincheirou no seu lado do campo no templo complementar e durante toda a prorrogação, levando a decisão para os penais. Naquela partida, Zidane estava de volta à equipe, e comandou as principais jogadas dos Azuis, encurralando os adversários. No entanto, o narrador da Globo cismava em implicar com o jogador, toda hora chamando a atenção de Casagrande, o comentarista daquela ocasião, dizendo, ''olha, e os franceses tinham muita esperança nesse jogador, mas ele não está resolvendo...''


Na quarta vez em que ouviu a ladainha, Casagrande não aguentou. Explodiu contra o narrador dizendo quase aos gritos, ''pra mim, ele está muito bem, está arrebentando. Agora, fazer tudo certo o tempo todo só se fosse o Pelé!"


Assim como aconteceu com Casagrande, foi aquela atuação que me convenceu de que Zidane era um craque daquele naipe decisivo, que cresce na ''hora da onça beber água''. Desnecessário recordar como Zizou conquistou aquela Copa para seu país. Depois de sair da Juventus, se tornou em líder e principal estrela de um Real Madri repleto de gente graúda, chegando a eclipsar até mesmo Ronaldo Fenômeno no time. Foi dele um dos mais belos gols da história da Liga das Campeões, garantindo o título para o clube madrilenho.


Apesar disso, a história de Zinedine é indissociável da seleção francesa. Ele fez o país se esquecer um pouco do grande Michel Platini, abandonar o posto secundário que ocupava no futebol mundial, e ganhar uma Eurocopa, mais uma vez com um tento decisivo de seu principal jogador. Zidane fez da França uma potência europeia e mundial.


Problemas físicos impediram que brilhasse na Copa de 2002, mas quando ninguém mais acreditava, nem mesmo os franceses, o meio campista desenhou as mais belas páginas de sua carreira em pleno Mundial da Alemanha.


O experiente atleta brigou com a imprensa, com quem não trocou um só pio durante a Copa. Depois da sofrida classificação para as oitavas, realizou duas das maiores atuações de um atleta numa competição entre seleções, inclusive contra o nosso escrete -- que era a grande favorita para a conquista.


Zinedine ficou conhecido pela expulsão na final de 2006 depois de aplicar uma cabeçada no defensor da Itália. Até a justificativa para a agressão despertou admiração em alguns. Segundo Zizou, o sujeito havia ferido a honra de sua irmã, e nem uma final de Mundial justificaria uma omissão dele diante da ofensa. Nesse episódio, o meia mostrava o quanto havia de argelino nele.


Zidane não era um meia de dribles deslumbrantes, de firulas, de espetáculos desnecessários. Nesse aspecto, ele lembrava muito o nosso Gérson ''Canhotinha de Ouro'', cuja genialidade se expressava por um domínio da pelota e do jogo na meia cancha, pela qualidade do passe, do chute, e pela liderança indiscutível no gramado.


Talvez seja também o mais conhecido carrasco do Brasil em Copas do Mundo, roubando um posto que pertencia a Paolo Rossi.

OS 10 MAIORES JOGADORES DA HISTÓRIA, NÚMERO 8: KYLIAN MBAPPÉ

 A precocidade de Kylian não é demérito, mas um ponto a seu favor. Com duas finais de Copa, um título, artilharia em 2022, e prêmio de Revelação em 2018, sua marca na competição é indelével, inesquecível e assombrosa. Em uma era que venera os números, ressalto que o francês, que completa 24 anos de idade neste 20 de dezembro, já tem cerca de 260 gols na carreira. E não são gols quaisquer. Mbappé é jogador de jogo grande.




NÚMERO 8: KYLIAN MBAPPÉ



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Alguns podem considerar cedo incluir Mbappé entre os 10 maiores jogadores da História. Mas se Maradona terminasse sua carreira em 1986, ninguém contestaria que 'El Pibe de Oro' já estava no Olimpo. Ronaldo Fenômeno já se encontrava entre os grandes com a conquista da Copa em 2002, antes mesmo de vencer qualquer competição continental e mesmo nacional. Para não falar do incomparável Pelé.


A precocidade de Kylian não é demérito, mas um ponto a seu favor. Com duas finais de Copa, um título, artilharia em 2022, e prêmio de Revelação em 2018, sua marca na competição é indelével, inesquecível e assombrosa. Em uma era que venera os números, ressalto que o francês, que completa 24 anos de idade neste 20 de dezembro, já tem cerca de 260 gols na carreira. Tudo indica que é jogador para 700 gols, o que o tornaria um dos maiores artilheiros já vistos.


E não são gols quaisquer. São quase 40 com a camisa dos "Azuis", colocando-o na disputa pelo posto de maior artilheiro de sua seleção nacional já no ciclo para a América do Norte 2026. Em Copas do Mundo, são 12 tentos em 14 partidas, média rigorosamente igual à de Pelé [0,85], sinalizando que está na briga por ser o maior artilheiro da história da competição [o alemão Miroslav Klose tem 16 gols].


Sua média cresce nos momentos mais cruciais: nas fases eliminatórias, balançou a rede 8 vezes em 8 jogos, média de um gol por partida. São 4 em duas finais distintas de Mundiais, incluindo o "hat-trick" de domingo passado. Ele é agora o atleta com mais gols em finais de Copa, superando Pelé e Zidane [cada um com 3 tentos]. Está ao lado do inglês Geoff Hurst, que também fez um hat-trick em 1966. E junto com Pelé, Vavá, Zidane e Breitner, é o único atleta a marcar em duas decisões.


Mbappé é jogador de jogo grande. E além da mortal capacidade de definição, é um dos atletas mais velozes das últimas décadas, com uma capacidade de desacelerar e reacelerar que poucos já viram. Mas também se move bem em espaços curtos, tem visão de jogo, excelentes passe e cruzamento, e versatilidade para atuar nas pontas, como atacante pelo meio, e de centroavante. Um atacante completo e diferenciado, o mais próximo nessa década de uma força da natureza.


Filho de imigrantes africanos, faz parte também de uma geração que afirma a própria identidade nacional com suas vitórias pelos "Azuis". Kylian é parisiense. Nascido e criado na capital francesa. Iniciou sua carreira em um clube da capital e, depois de chamar atenção de gigantes como o Real Madri e o Chelsea, assinou contrato com o Mônaco, se transformando no jogador profissional mais jovem da equipe, um recorde que pertencia a Thiery Henry. Mbappé se tornou o eixo do projeto francês em torno do Paris Saint German, de projetar o "futebol-champanhe" no continente como uma expressão da vitória do 'direito do solo' na aquisição da nacionalidade e integração à Europa.


O tempo dirá se o ciclone francês subirá ainda mais na lista. Mas eu diria que esta é uma aposta bastante segura. A França vive sua era de ouro no futebol. Mbappé é o atacante de maior valor de mercado na Europa e atua por um dos mais ricos e mais poderosos times do Velho Mundo. E só agora ele está decolando rumo ao seu auge atlético. 

segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

OS 10 MAIORES JOGADORES DA HISTÓRIA, NÚMERO 9: BECKENBAUER

 Franz era sinônimo de elegância nos gramados. Quase um paradoxo, ele se tornou um atleta completo assim que trocou o meio campo pela zaga central. A mudança de posição não o transformou em mais um zagueiro habilidoso como tantos outros, e sim na referência principal de uma transformação tática que marcou décadas de futebol alemão, a criação da função de líbero no país, não "à italiana", mas jogando livre e construindo a equipe por trás. Beckenbauer ficava na sobra na linha de defesa, mas era também a principal saída de bola e o grande armador do Bayern e da Alemanha.






NÚMERO 9: BECKENBAUER


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'Der Kaiser' é um atleta que, praticamente consenso nos anos 1980 e 1990, tem sido um tanto esquecido nas grandes listas dos últimos dez anos. Seja porque o futebol alemão tenha passado por problemas de renovação depois do tricampeonato mundial e só superados recentemente, talvez por causa dos escândalos de corrupção na FIFA que envolveram seu nome, seja por um lapso da ''memória coletiva'', o jogador símbolo do Bayern de Munique anda com a cotação em baixa.


O grande capitão germânico era imprescindível em qualquer top 5 até pouco tempo atrás. Na eleição para jogador do século que a FIFA empreendeu em 1999, com um Grande Júri formado por dirigentes esportivos, ex-jogadores, jornalistas e analistas de todo o mundo, Beckenbauer ficou em quarto lugar entre os maiores futebolistas da História, logo atrás de Johan Cruyff. Já a Federação Internacional de História e Estatísticas do Futebol o escolheu como terceiro melhor de todos os tempos.


Em minhas recordações, 'O Imperador' é o sujeito que igualaria em 1990 o feito de Zagallo. Como técnico do time alemão, levantou a Copa do Mundo da Itália e se tornou o segundo homem a conquistar o título tanto como jogador quanto como treinador [Meu pai corrigiu ao ouvir um narrador anunciar a façanha: ''Zagallo venceu DUAS vezes como jogador e uma como técnico!''].


Franz era sinônimo de elegância nos gramados. Quase um paradoxo, ele se tornou um atleta completo assim que trocou o meio campo pela zaga central. A mudança de posição não o transformou em mais um zagueiro habilidoso como tantos outros, e sim na referência principal de uma transformação tática que marcou décadas de futebol alemão, a criação da função de líbero no país, não "à italiana", mas jogando livre e construindo a equipe por trás. Beckenbauer ficava na sobra na linha de defesa, mas era também a principal saída de bola e o grande armador do Bayern e da Alemanha.


O 'pai dos líberos' foi um dos principais destaques do time alemão ocidental que chegou à final contra a Inglaterra em 1966, marcando quatro gols naquela campanha.


Ainda que a seleção germânica não tenha ido à decisão no México, 'Der Kaiser' protagonizou partidas épicas junto com sua equipe: a eliminação do 'English Team' nas quartas de final seguido d'O Jogo do Século contra os italianos em uma das semifinais do torneio. Esse confronto terminou na prorrogação com o placar de 4 a 3 para os italianos, e Beckenbauer atuou boa parte do tempo com uma tipoia improvisada depois de ter deslocado o ombro em uma disputa ainda no segundo tempo do jogo, quando sua equipe se encontrava com a desvantagem de um 1 tento a 0 no placar.


Não bastassem duas Copas brilhantes, Franz emendou uma terceira. Em 1974, ele conduziu a Alemanha Ocidental à conquista da Copa jogada em casa, superando na final o Futebol Total da Holanda de Johann Cruyff.


Beckenbauer foi o líder técnico daquela que se tornou a maior geração da história do futebol alemão. Sua carreira em clubes é também brilhante, tornando-se não só o maior ídolo do Bayern de Munique mas sendo escolhido Presidente da icônica equipe europeia. A dinâmica do esquecimento e da memória, que também se abate sobre outros grandes craques, vai trazer a imagem d'O Imperador à tona mais dia menos dia.

domingo, 18 de dezembro de 2022

OS 10 MAIORES JOGADORES DA HISTÓRIA, NÚMERO 10: ZICO

 Seus dribles e perfeição técnica levam o Rei Pelé a afirmar até hoje que Zico foi o jogador brasileiro que mais chegou próximo dele. Assim como outros monstros do esporte, Zico não venceu uma Copa do Mundo, fazendo parte de um clube que conta com Zizinho, Puskas, Leônidas da Silva, Cruyff, Eusébio, Di Stefano, Platini, Júnior, Cristiano Ronaldo. A diferença é que o ídolo rubro-negro virou símbolo de uma das seleções mais amadas pelo planeta bola, tão fantástica que é considerada a maior seleção a não vencer um Mundial, ao lado da "Laranja Mecânica" de 1974.




Poucas brincadeiras são tão legais para um torcedor quanto fazer listas de melhores times, seleções, jogadores, partidas etc. Vou atualizar a minha lista de maiores jogadores de todos os tempos. Lembrando que esta é a minha lista, com textos que justificam minhas escolhas. Cada um pode fazer a sua, com os critérios e justificativas que lhe parecerem mais adequados. A discussão sobre estes pontos não tem fim, e penso que a presença dos meus escolhidos pode ser defendida sem nenhum apelo ao absurdo.


NÚMERO 10: ZICO


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O imortal Nelson Rodrigues chegou a declarar no início dos anos 1970 que estava dedicado a ir de bar em bar, de rua em rua, de portão em portão para transmitir sua verdade, a de que Zico era o melhor jogador do mundo. Desde os tempos dos irmãos Antunes no Fluminense e Edu no América se profetizava que o craque daquela família de boleiros do subúrbio carioca era o franzino Arthur, que comia a bola em campeonatos de bairros e no futebol de salão.

Criado em uma família na qual o Flamengo era uma religião, Zico possuía o mesmo problema que Messi apresentaria ao Barcelona quase meio século mais tarde, um físico franzino que só lhe permitiu jogar profissionalmente depois de um severo e planejado tratamento de vanguarda.

O garoto conquistou a torcida de cara e conduziu um grupo de juvenis ao título carioca de 1974. Seus dribles e perfeição técnica levam o Rei Pelé a afirmar até hoje que Zico foi o jogador brasileiro que mais chegou próximo dele. O futebol do ''Galinho de Quintino'' amadureceu em um misto de inteligência, habilidade no drible, perfeição nos passes, destreza na bola parada e faro de gol que deixariam extasiados os torcedores do Flamengo, os amantes do futebol e a crítica especializada dentro e fora do país.

Zico fez do Maracanã sua casa, tornou-se o maior artilheiro da história do estádio mais importante de todos, e levou o Flamengo a uma hegemonia crescente: primeiro no Rio de Janeiro, depois no Brasil e por fim na América do Sul e no mundo. O ''Camisa 10 da Gávea'' se transformou em uma lenda sem fronteiras, líder de uma equipe que foi considerada pelo Grande Júri da FIFA, reunido no fim do século XX, entre as dez melhores já vistas.

Assim como outros monstros do esporte, Zico não venceu uma Copa do Mundo, fazendo parte de um clube que conta com Zizinho, Puskas, Leônidas da Silva, Cruyff, Eusébio, Di Stefano, Platini, Júnior, Cristiano Ronaldo. A diferença é que o ídolo rubro-negro virou símbolo de uma das seleções mais amadas pelo planeta bola, tão fantástica que é considerada entre as maiores já montadas pelo Brasil ainda que não tenha ficado sequer entre as quatro primeiras da Copa de 1982. Muitos consideram o Brasil daquele ano como a maior seleção a não vencer um Mundial, ao lado da "Laranja Mecânica" de 1974. O Galinho brilhou em campos espanhóis com o mesmo fulgor e magnitude com que comandava o Flamengo em seus dias de glória.

Maior goleador da seleção depois de Pelé, fenômeno de popularidade na pequena Udinese -- com a qual chegou a disputar a artilharia do italiano contra Platini, que atuava pela poderosa Juventus --, maior ídolo da história do clube de maior torcida do Brasil, o Galinho de Quintino também conheceu a dor e a tragédia, seja por não ter levado o escrete canarinho à conquista de uma Copa -- o que lhe daria uma dimensão ainda maior nessa lista, seguramente entre os cinco primeiros --, seja pelas limitações físicas que o acompanharam na fase final de sua trajetória, vítima da violência de adversários que quase puseram um ponto final em sua carreira.

No início dos anos 90, depois da primeira aposentadoria, Zico foi escolhido pelos japoneses para se tornar a estrela que consolidaria um campeonato nacional no país, também aqui similar à ida de Pelé para o Cosmos, nos Estados Unidos. A estrela surgida no Rio, conquistadora do Maracanã e do mundo, foi também inesquecível no país do sol nascente.