Sempre que vem à tona discussões sobre o teto de gastos do Estado, que ameaça paralisar e destruir os serviços públicos já a partir do ano que vem, o Ministro da Economia Paulo Guedes vem com a ladainha de que é necessário ''quebrar não o teto, mas o piso''.
O que ele quer dizer com isso? Que o Orçamento deve ser inteiramente desvinculado, isto é, deve-se pôr fim àquele patamar mínimo de grana que a Constituição exige que seja usado em algumas áreas, incluindo aí Educação e Saúde.
"Quebrar o piso'' significa que o Estado vai poder investir cada vez menos nessas áreas sempre que a Banca exigir o pagamento de mais juros extorsivos daquela dívida que ninguém sabe como foi construída e que ninguém sabe quem são os credores -- porque o Banco Central os mantém em segredo e a ''politicalhada'' não permite nenhuma auditoria.
É um ataque direto a direitos sociais pactuados, como a expansão do Sistema Único de Saúde. Sem o SUS, a maioria esmagadora da população ficaria sem os atendimentos não apenas prioritários, do dia dia, mas também tratamento sofisticados para casos melindrosos.
A máfia dos planos de saúde, que vem sendo promovida desde o governo Fernando Henrique Cardoso, cobra cada vez mais caro para serviços cada vez piores, sem o ônus de assumir uma visão republicana para a saúde: perspectiva que exige que todos os cidadãos possuam o mesmo atendimento do sistema, independente de renda ou qualquer outro fator.
Para os cartéis que lucram com saúde alheia, se você não tem direito de pagar, então que sofra com o problema ou morra.
O SUS tem inúmeros problemas, principalmente em regiões metropolitanas e no Nordeste/Norte do país, mas eles são exagerados pela propaganda liberaloide que quer fortalecer as máfias que avançam sobre os serviços que deveriam ser garantidos pelo Estado.
Os planos de saúde costumam ter problemas de atendimento semelhantes ou muito piores, com as raríssimas exceções daqueles que podem pagar um valor absurdo por mês para conseguir tratamento, segundo uma lógica implacável e criminosa do mercado.
De todo modo, em muitas regiões, na maioria delas afinal, o SUS é o esteio da prevenção e do atendimento de saúde da população. E em diversos casos, com qualidade invejável para diversos países.
Abaixo, deixo um relato feito em um grupo de discussões do Yahoo, ainda no final da década passada. O autor, cujo nome vou resguardar por ter perdido um pouco contato com ele, era liberal, seguidor de Olavo de Carvalho, francamente pró-ianque e pró-sionista, declaradamente conservador, e odiava com todas as forças o PT e as esquerdas. No entanto, ele é médico também e trabalhou no SUS.
A Saúde Pública precisa de mais dinheiro, não de menos. O discurso de Paulo Guedes é típico daqueles bilionários que não estão nem aí se 99% da população não poderiam pagar um tratamento decente quando o bicho pegar. É um discurso ''norte-americano'', que pensa que quem merece usufruir da ''boa vida'' é quem tem dinheiro, já que acreditam que ''ter grana'' é mera questão de mérito, se fazendo cegos para as diversas relações de poder que formatam as hierarquias sociais, os conflitos entre grupos num mesmo território ou sociedade, e as oportunidades pessoais.
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O SUS não é uniformemente ruim, a gestão é municipalizada e pode apresentar qualidade bastante interessante. Trabalhei em locais onde a iniciativa privada mal existe, tal a qualidade do serviço público.
Onde trabalho, hoje, os PSFs são novos, amplos, confortáveis, bem equipados com direito a ar condicionado e TV Lcd, meus meninos fazem a vacinação num deles, enfermeiras são nossas conhecidas e o MP juntamente com o Conselho Municipal de Saúde acompanham toda e qualquer queixa em relação à qualidade de serviço com muito rigor.
Poucas clínicas particulares oferecem o conforto e comodidade do ambulatório que nos servem, consultas são agendadas até por telefone, não há filas e nem macas no corredor. Respeitando o protocolo de urgência, em meia hora o paciente tem sua situação definida e encaminhada. Regulamos o SAMU numa área de mais de vinte municípios e estamos recebendo uma UPA, um tomógrafo e um aparelho de radioscopia.
Formamos a primeira turma de auxiliares e técnicos de enfermagem bancado pelo SUS e prefeituras da região. Não posso reclamar do meu salário, não faço jornada dupla, trabalho muito, mas em um só serviço. Isto só acontece porque as pessoas envolvidas são dedicadas e se imbuíram da missão de fazer, mesmo subfinanciado, a excelente idéia do SUS funcionar.
É o melhor convênio, mais auditado, que mais liberdade dá ao profissional e o menos burocrático de todos. Paga pouco, mas pontualmente. A defesa do SUS e o fortalecimento dele é um imperativo de todo cidadão que quer ver um sistema único no mundo na qualidade da concepção institucional vingar.
O SUS, melhorando, significa que o país tb melhora.
Em cidades maiores, acredito que a demanda crescente e a qualidade sofrível de serviço em municípios que não atentam para a responsabilidade de organizar O sistema, sobrecarregam esses serviços e fazem o cobertor curto, além de uma gestão perdulária com os parcos recursos.
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