domingo, 7 de abril de 2019

Série Grandes Temporadas da Era Aberta IV: John McEnroe, 1984


AMOR E IRA


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Em certo sentido, John McEnroe não é polêmico. É consenso de que foi um dos maiores gênios a empunhar uma raquete. E é consenso que se trata de um dos jogadores mais temperamentais e deseducados a atingirem o estrelato. 



As duas características sequer são contraditórias já que os descalabros e acessos de fúria serviam de impulso para o tenista, que aumentava seu nível de tennis após a demonstração dum comportamento vexaminoso.



Seu incomensurável talento se revelou já na primeira vez em que disputou Wimbledon, em 1977. Ainda um garoto de 18 anos, que segundo ele próprio nunca havia jogado no saque e voleio até aquela data, John veio do qualifying para fazer a semifinal do torneio, perdendo por quatro sets para o número um do mundo de então, seu compatriota Jimmy Connors. A rivalidade que se instauraria entre os dois é um capítulo à parte da história, transbordando para um ódio pessoal que algumas vezes quase chegou às vias de fato nas quadras.

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No ano seguinte, entraria no 'Championships' como um dos grandes favoritos, e sua queda na estreia, em uma zebra histórica contra Tim Gullikson, ajudou a construir a fama da Quadra 1 como ''Cemitério dos Campeões''. Naquela mesma temporada, o jovem gênio conquistaria a Master Cup [atual ATP Finals] pela primeira vez em sua carreira, passando a dominar o US Open nos primeiros anos em que o major de New York passou a ser disputado em hard courts.

Poucas rivalidades foram tão marcantes quanto a de McEnroe e Bjorn Borg. Logo se percebeu que o norte-americano estava destinado a colocar fim à hegemonia do sueco em Wimbledon, e talvez no circuito. Os dois eram a exata contraposição um do outro. 

O ás do saque e voleio, canhoto de tennis clássico e serviço imprevisível, dono das quadras duras rápidas e perito no jogo de grama; contra o incansável jogador de fundo, Rei do saibro e do top spin. O explosivo garoto, movido a paixão e fúria, a desacato e histeria; contra o fleugmático, impassível e frio nórdico, que jogava todos os pontos de todas as partidas com a mesma expressão sem emoção. Fogo contra Gelo.

[É notável que o norte-americano nunca tenha explodido de raiva em um confronto contra Borg. Ele explicou anos mais tarde que seu respeito ao adversário o impedia de qualquer atitude desse tipo.]

O embate foi o que mais atraiu mídia na Open Era, só podendo ser comparado à repercussão atingida vinte e cinco anos depois pelos confrontos entre Federer e Nadal. McEnroe e Borg disputaram duas finais de US Open e duas finais de Wimbledon. 

A decisão de 1980 no All England Club é considerada por muitos como a maior final da história do torneio, vencida por Borg em um 8 a 6 no set decisivo. O tie break do quarto set, definido a favor de ''Big Mac'' por 18-16, é considerado por muitos como o mais emocionante e técnico enfrentamento já visto em decisões de majors. Foi também a maior audiência em jogo de tennis já registrada pela BBC, uma marca ainda não batida.

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Em 1981, John McEnroe cumpriria seu destino e destronaria Borg ao vencer a final em quatro sets. Entre 1980 e 1984 foram cinco finais consecutivas, com a conquista de três troféus. 

Verdade seja dita, até as erupções do ''Big Mac'' eram acompanhadas por aquela criatividade que flagrava o gênio. Por mais constrangedoras que tenham sido, se tornaram tiradas hoje usadas pela organização de Wimbledon como propaganda de seus 'maiores momentos'. A mais conhecida, provavelmente, é o jargão ''You cannot be serious'' que McEnroe urrava contra os juízes de cadeira durante sua vitoriosa campanha em 1981, e que mais tarde se tornou o título de sua autobiografia. 

Por essas explosões, o norte-americano passou pelo constrangimento de não ganhar naquele ano o título de sócio que o All England Club concede a todos os campeões. [ele teve de esperar o bicampeonato, em 1983]. Mas hoje há os que consideram que a pressão de McEnroe contribuiu para a profissionalização dos juízes de linha. Do mal do artista nascia um bem.

1984 é considerado por muitos especialistas como o ano em que os amantes do esporte dos Reis acompanharam o maior domínio de um tenista sobre o circuito. John McEnroe venceu 82 jogos e saiu derrotado apenas 3 vezes de quadra naquele ano -- o menor número no tennis masculino desde Bill Tilden, em 1925. O americano alcançou o incrível aproveitamento de 96,5%, nunca superado na Era Aberta.

Na construção desses números, o temperamental e genial tenista abocanhou nada menos que 13 títulos, incluindo aí 2 Grand Slams, Wimbledon e US Open, e a 'Master Cup' [Atual Finals]. A estatística fica ainda mais impressionante quando consideramos que ele pulou o Aussie Open e que chegou a ter dois sets acima contra Ivan Lendl na decisão de Roland Garros.

1984 também viu McEnroe enfileirar a maior sequência de vitórias no início de uma temporada: foram 42 jogos invictos até a derrota na final de Rolanga. Para se ter uma ideia, Djokovic, em 2011, possuía 41 vitórias antes de cair para Federer na semifinal em Paris.

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O nível de jogo alcançado por 'Big Mac' proporcionou algumas das melhores exibições já vistas em qualquer tempo, como a demolição de Connors na final de Wimbledon [6-1, 6-1, 6-2] e a destruição de Edberg [6-1, 6-0, 6-2] no US Open. O circuito se encontrava diante da plenitude de um gênio total.

Seu domínio sobre os rivais não deixa dúvida sobre a hegemonia de McEnroe. Foram seis vitórias em sete jogos contra Ivan Lendl, e seis vitórias em seis jogos contra Jimmy Connors. O americano bateu também Edberg, já citado, e Geirulatis, Miroslav Mecir, Mats Wilander, dentre outros.

Até hoje, quando se pretende defender que o ano de um tenista é um dos melhores da história, a comparação mais imediata é com esse espetacular ano de um dos mais habilidosos atletas a empunhar uma raquete.

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