terça-feira, 8 de junho de 2021

O Flamengo é a esperança contra a ''espanholização'' do futebol brasileiro

Matéria do GE [Globo Esporte], em 2018, tentava explicar a hegemonia paulista a partir dos anos 2000. Naquele ano, o futebol de São Paulo seria campeão de novo.


Tem se tornado comum entre rivais a reclamação de que a arrumação nas contas do Flamengo e a ascensão do clube rubro-negro nos últimos três ou quatro anos "espanholiza'' o futebol brasileiro. O muxoxo não passa de uma distorção completa dos fatos ocorridos nos últimos trinta anos.


Como é repetida insistentemente, parte da geração mais nova, que não tem a perspectiva histórica correta, acaba embarcando nessa furada. Aliás, divulgar mentiras absurdas e escabrosas sobre o Flamengo é recorrente na torcida arco-íris, embora geralmente não seja por má intenção.

Entre 1971 e 2000, nos 30 primeiros campeonatos brasileiros, os clubes paulistas levantaram 11 títulos [36%] contra 11 dos cariocas [36%] e 8 [28%] das equipes das demais federações estaduais. Não havia nenhum estado que pudesse bater no peito e dizer que dominava o futebol brasileiro. [1]

Entre 2001 e 2018, no entanto, os paulistas ganharam 11 dos 18 campeonatos brasileiros disputados. Ou seja, cerca de 62% de todos os torneios. Os cariocas tiveram sua participação reduzida para 3 [16%]. As outras federações tiveram a fatia reduzida para 22%. [Se esticarmos até 2020, já incluindo a ascensão do Flamengo, as proporções ficam em 55% pra São Paulo, 25% pro Rio, 20% pras demais federações].

Se analisarmos os números década a década, notamos o mesmo processo de concentração em torno dos clubes paulistas. Na década de 1970, São Paulo venceu 4 brasileiros, contra 2 dos cariocas e 4 das demais federações. Na de 1980, a vantagem foi toda carioca: 5 taças contra 2 dos paulistas. As demais federações levaram 3 [ou 4, dependendo de como se considere 1987]. Nos anos 1990, São Paulo conquista 5 taças, contra 4 do Rio e apenas 1 das demais federações. Apesar da vantagem paulista nos anos 1990 e da dificuldade das demais UFs acompanharem o ''eixo'', a hegemonia paulista ainda não se realizara.

Mas na primeira década do novo século, São Paulo leva SEIS campeonatos brasileiros, cinco deles CONSECUTIVOS. O Rio fica com apenas 2. As outras unidades da Federação com 2 também. Entre 2011 e 2018, São Paulo levanta 5 dos 8 troféus, contra 1 do Rio e 2 das demais UFs.

É evidente para qualquer um que analise os números com a mínima honestidade que a ''espanholização'' vem acontecendo sim: ela é a imensa, inédita, e aparentemente irrefreável concentração de recursos nos clubes paulistas.

Isso não afetou apenas o Rio. O Rio Grande do Sul não vence um Brasileirão desde 1996, há vinte e cinco anos! Minas Gerais conseguiu conquistar brasileiros mas a um preço que só agora se torna claro: a destruição financeira do Cruzeiro, que já está há dois anos na segunda divisão e sem perspectivas concretas de melhoras.

Quando um torcedor afirma que "o Flamengo ameaça espanholizar o futebol brasileiro'', a única reação possível é o sorriso irônico. Como assim? É justamente o contrário. O Flamengo é o único clube com capacidade de, pelas próprias forças, fazer frente à hegemonia e concentração de recursos em torno do futebol paulista.

Como 'naturalizam' uma superioridade que só foi imposta recentemente, os torcedores dos grandes clubes de São Paulo não percebem essa obviedade. Ganham quatro ou cinco brasileiros seguidos e acham ''normal''. O Flamengo ganha dois, e o futebol brasileiro está seriamente ameaçado pela concentração econômica. Só pode ser piada.

Eis a missão histórica do Flamengo na próximas décadas. Colocar limites à ''espanholização'' provocada nas últimas três décadas. Só nós podemos fazê-lo. Porque só nós temos condições de enfrentar a máquina de dinheiro do maior estado do país. ____________________________________

[1] Na década passada, a CBF reconheceu a Taça Brasil e o "Robertão" como títulos equivalentes ao campeonato brasileiro. Não pretendo entrar nessa polêmica agora, mas convém reconhecer que, independente da natureza desses torneios, eles eram encarados de maneira secundária pelas equipes do Rio de Janeiro e de São Paulo, que tinham como principal objeto de desejo seus respectivas campeonatos estaduais. Para os clubes do ''eixo'', essa realidade só muda a partir de meados dos anos 1970, quando o Campeonato Brasileiro ''pega no breu''.

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