domingo, 10 de novembro de 2019

LULA ESTÁ SOLTO, ou: o momento do PT explicar seu neoliberalismo, ''udenismo'' e anti-trabalhismo




''Como os exemplos mostram, da direita à esquerda, a sociedade brasileira é colonizada por uma mesma interpretação. [...] Para mim, esse sucesso tão acachapante reflete a vitória do liberalismo conservador entre nós, levando à colonização, inclusive, do pensamento crítico e de ''esquerda'' no Brasil''.

Jessé Souza, "A Elite do Atraso''





Pergunta aos petistas.


Quando Lula estava preso, eles diziam que ''não era o momento de fazer críticas ao PT''. Mas e agora que ele está solto?

Que tal enfrentar a realidade e responder por que tanto no poder quanto em sua ascensão rumo ao Palácio do Planalto, a Era PT foi marcada pelas seguintes características:




1) A ''financeirização'' da economia brasileira', com a consolidação de um cartel de bancos que praticava o juros mais extorsivos do mundo [1];


2) Tripé macro-econômico de Armínio Fraga, âncora do neoliberalismo do país [2];


3) Entrega da economia nas mãos do liberal Henrique Meirelles, um funcionário do Banco de Boston;


4) Dependência de commodities para segurar as contas externas [3];


5) Desindustrialização do país, construindo o período de pleno emprego da Era Lula em serviços de baixa qualificação, a famosa ''economia de shopping'', ou seja, baseada em crédito farto, endividamento das classes populares, e empregos precários [4];


6) Prda de sofisticação da indústria e surto de empregos de baixa qualidade, levando à estagnação da produtividade;


7) Diante dos aumentos de salário mínimo em um cenário de perda de produtividade da economia, crescimento de uma inflação de serviços que pesou nos ombros das classes populares;


8) Avanço da terceirização nas empresas públicas, na saúde e na educação [5];


9) A política social mais famosa do governo, o Bolsa Família, era copiada da Escola de Chicago, um dos maiores símbolos do neoliberalismo e de onde saiu Paulo Guedes [6];


10) A desigualdade social estrutural do país não diminuiu nos governos do PT. Quem mais ganhou foram os 10% mais da pirâmide de renda do trabalho [7];


11) Realização de reformas da previdência, trabalhistas e previdenciárias sempre que exigido por banqueiros e empresários [8];


12) Desoneração da folha de pagamento segundo exigindo pela Fiesp, com isenções de impostos que levaram o país a uma crise fiscal sem precedentes [as "reformas" liberais, a partir de então, são impulsionadas porque a FIESP se recusa a ''pagar o pato''] [9];


13) Desmobilização dos sindicatos e do MST para reduzir a confrontação política aos períodos eleitorais [10];


14) Perseguição violenta das insurreições populares que explodiram no Brasil em 2013 e 2014 e reivindicavam maior e melhor presença do Estado nos serviços públicos, chegando até a uma lei antiterrorismo e a prisões arbitrárias [11];


15) Concessão de poder de investigação ao Ministério Público, criando o monstrengo que se voltaria contra o próprio partido e contra o país [12];


16) Aliança com o partido democrata dos EUA, o mesmo que investigou em massa o governo de Dilma Roussef e se aliou á Força Tarefa de Curitiba pra atacar as instituições brasileiras e permitir a ascensão do liberalismo no sistema partidário [13];


17) Adotou uma postura udenista, com discurso moralizante anti-corrupção, em toda a sua história, não se diferenciando o mais patético e tosco fiel de Serginho do Mal, vulgo Moro [14];


18) Ausência de Reforma Política, Reforma Tributária e de uma mudança no financiamento público, para reduzir a dependência da dívida pública;


19) Ausência de Regulação da Mídia para diminuir o poder das grandes corporações e famílias ligadas ao rentismo, como a Rede Globo e o Grupo Folha/UOL [as famílias Marinho e Frias, que comandam esses grupos, estão entre as 15 de maior fortuna no país segundo edição de setembro da Revista Forbes];


20) Nunca auditou uma dívida pública, cujos credores são mantidos em segredo pelo Banco Central e tem ares de fraude;


21) Nunca realizou qualquer acordo que não tivesse o objetivo de manter sua hegemonia no campo da esquerda, ainda que para isso precisasse mentir para o eleitorado [''Lula 2018'', ''Lula 2022''], trair aliados e permitir a ascensão de Bozó e outros liberais;


22) Sempre vilipendiou a ligação entre líder e massas para além dos limites partidários, fazendo eco das acusações da USP ao Trabalhismo [chamado de ''populismo''], pra depois se agarrar ao lulismo messiânico e sectário [15];


23) Criticou durante toda sua história a figura e ação política de Getúlio Vargas para agora tentar se colocar, por pura conveniência, na tradição do nacionalismo popular do fundador do Trabalhismo;


24) Se aliou com o que há de mais podre na política brasileira: Temer, Cabral, Cunha etc., corruptos notórios, alguns deles ligados a máfias da jogatina;


25) Se aliou com a banda mais podre e mafiosa das lideranças evangélicas, que hoje dão sustentação ao governo de Bolsonaro: Edir Macedo e Silas Malafaia [16];


26) Atacou, sem dó nem piedade, a moralidade popular ao se abraçar à militância identitária pós moderna que gostariam de transformar o país em um puteiro de drogadicção, rufianismo e anti-cristianismo [17];


27) Foi leniente com a violência urbana e a consolidação do país como um dos maiores consumidores de drogas do mundo [18];


28) Tornou o aborto e a ideologia de gênero em dogmas a ser impostos a uma população que discorda visceralmente de ambos [19];


29) Escolheu para o STF gente fanática, sem fibra moral e pilantras notórios [20];


30) Fez questão de alienar as Forças Armadas com uma ''Comissão da Verdade'' que não acrescenta em nada para o ambiente político e a história do país [21].


Os pontos incômodos listados acima mostram que, não importa o que Lula e as lideranças petistas digam, nunca foram, de fato, alternativas reais ao sistema neoliberal hegemônico na Nova República. Tanto seus discursos quanto suas ações políticas estavam contaminadas desde o início e até a raiz por uma perspectiva pequeno-burguesa, liberaloide e "californiana''. 


Como dizia Leonel Brizola, o PT cacareja muito pra esquerda, mas coloca ovos para a direita. Seu compromisso é com o consenso e o status quo atual, e sua história e anos no poder são a demonstração inequívoca disso.


O PT e Lula são mais do mesmo.






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[2] “Esses dados estatísticos reforçam evidências históricas sobre a continuidade macroeconômica entre os governos FHC e Lula. Ainda durante a campanha eleitoral de 2002, quando a banca internacional temia uma radicalização a esquerda de Lula, todos os principais candidatos assinaram um compromisso de manter os acordos firmados e defender a estabilidade. Como relata o recente livro de Matias Spector sobre a transição dos governos FHC para Lula, o presidente tucano se esforçou para convencer a banca internacional de que Lula não promoveria o caos econômico nem daria o calote na dívida.  Daí resultou uma dobradinha entre o então ministro da fazenda Pedro Malan e seu sucessor, Antônio Palloci. Em janeiro, não por acaso, seria anunciado o novo presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, tucano e totalmente alinhado ao tripé macroeconômico e respeitado pela banca internacional.” http://mercadopopular.org/economia/se-o-tripe-e-neoliberal-lula-e-o-campeao-de-neoliberalismo-brasil/




[6] “O fato mais conhecido desse enredo foi a súbita apropriação da política macroeconômica de Fernando Henrique Cardoso (excomungada e rotulada pelo PT de neoliberal) pelo ex-presidente Lula desde o primeiro dia de seu governo, em 2003. Mas há outros, e vou tratar aqui de três: a privatização, a autonomia do Banco Central (BC) e o programa Bolsa Família. Os três foram gerados em ventres liberais[...]’’  https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,o-neoliberal-bolsa-familia-imp-,1092644

[7] “[A] Era petista aumentou a concentração de renda do trabalho. Tanto a faixa da pirâmide dos 1% quanto a dos 10% mais aumentaram sua participação na riqueza nacional. Os 50% menos também ganharam, é verdade, mas em proporção menor do que os escalões mais ricos. Quem perdeu foram os 40% que se situam entre os 50% menos e os 10% mais. Conclusão, o fosso social aumentou. No fim das contas, a participação conjunta dos 90% mais pobres decresceu de 45,7% para 44,4%. As dos 10% de maior renda aumentou de 54,3% para 55,6%.” https://portaldisparada.com.br/economia-e-subdesenvolvimento/desigualdade-aumentou-governos-pt/




[11] “Entre as lei aprovadas se destaca a de antiterrorismo, sancionada pela ex-presidenta Dilma Rousseff (PT) às vésperas dos Jogos Olímpicos de 2016 no Rio de Janeiro. "A gente tem uma lei que tem conceitos extremamente vagos, genéricos e que traz penas altíssimas. Quem vai decidir e compreender o que é provocar pânico e terror social? Sabemos que quem vai aplicar essa lei são os membros de Sistema de Justiça, marcado no Brasil por uma ação criminalizadora e repressora", argumenta Marques. Outra legislação citada pela advogada da Artigo 19 é a que proibia bandeiras e cartazes que não fossem manifestações "festivas e amigáveis" nos espaços dos jogos da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016. "O que é isso e quem vai decidir o que é festivo e amigável?", questiona ela, que ainda fala em legislações municipais e estaduais antivandalismo e que proíbem o uso de máscaras, por exemplo.

A organização também argumenta que, desde Junho de 2013, "marcado por uma total brutalidade e violência do Estado", as polícias militares dos Estados aprimoraram seus armamentos e sofisticaram suas táticas de repressão, com canhões sônicos, blindados israelenses, trajes Robocop, veículos com canhões de água, além do uso contínuo e indiscriminado de balas de borrachabombas de efeito moralcassetetes e spray de pimenta. Essa parte do estudo é baseada principalmente em percepções colhidas nas ruas, nos locais de protesto.”  http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/579907-o-cerco-legal-as-manifestacoes-como-um-duro-legado-de-2013



[14] “[O] discurso petista em 1989 começou a delinear aquelas que seriam marcas do partido por muito tempo: a crítica ao funcionamento do Estado, marcado por práticas de corrupção e favorecimento dos interesses privados, sem, no entanto, negar sua importância como regulador das relações sociais, e a proposta de uma nova ética na política. [...] As críticas do PT também se voltaram para o trabalhismo, visto como herança atrasada da Era Vargas a ser superada[...]” Américo Freire e Alessandra Carvalho, “As eleições de 1989 e a democracia brasileira: atores, processos e prognósticos”, em: O Brasil Republicano. O tempo da Nova República. Da transição democrática à crise política de 2016


[15] “Este artigo analisa a tática política adotada pelo Partido dos Trabalhadores (PT) na conjuntura de crise do governo Collor (1990-1992). Considera-se que o PT não tenha fugido à tendência dominante do movimento pró-impeachment, vindo a aderir à campanha pela ética na política e a atacar o presidente Collor a partir de um discurso de cunho moralista que menosprezou a crítica e a denúncia do caráter de classe da política neoliberal, satisfazendo-se apenas com a denúncia da política recessiva do governo.” http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-62762010000200010




[19] “ Lula disse que o debate em torno da legalização do aborto é uma “questão de saúde pública”. O presidente criticou a hipocrisia que não diferencia as situações que envolvem as mulheres ricas e as pobres.
“Não se trata de ser contra ou a favor [ao aborto]. Mas de se discutir com muita franqueza porque é uma questão de saúde pública. Se perguntarem quantas madames vão fazer aborto até em outro país? E as pobres que morrem na periferia? Não se trata de ser contra ou não. É preciso que se faça o debate”, disse o presidente.” https://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/lula-e-o-aborto/




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